Luedji Luna em Um Mar Pra Cada Um
Henrique Falci / Divulgação.

Crítica | Luedji Luna faz jazz brasileiro com elegância e entrega ao amor em ‘Um Mar Pra Cada Um’

Desde que despontou no cenário musical brasileiro com o disco “Um Corpo No Mundo” (2017), Luedji Luna vem revelando um nova camada de si mesma como artista a cada novo trabalho. Seu quarto e mais novo álbum, “Um Mar Pra Cada Um”, traz a versão mais segura e íntima da cantora e compositora baiana, que se mostra cada vez mais confortável em falar sobre o amor de uma forma profunda, filosófica e muito pessoal.

O disco encerra a trilogia iniciada com “Bom Mesmo É Estar Debaixo D’ Água” (2020), e a sua versão Deluxe (2022), que funciona como um álbum independente. Se no ponto de partida, a artista buscava falar de amor na perspectiva da mulher negra, agora ela mergulha ainda mais fundo nessa proposta, com olhar mais maduro e reforçado pela poesia das letras e pela atmosfera jazzística.

Capa de Um Mar Pra Cada Um
Divulgação.

“Um Mar Pra Cada Um” é marcado pela sonoridade muito mais voltada para o Jazz, mas ainda com ecos do neo soul e do r&b, com produção da própria artista, com diversos parceiros, incluindo o rapper e marido, Zudzilla. As 11 faixas brilham com arranjos de cordas e de sopros sofisticados que miram em “A Love Supreme” de John Coltrane e criam o clima de intimidade propício para que Luedji desnude canções sobre o desejo de amar e ser amada.

Nesse ponto, a cantora, que recém encerrou uma série de shows em que interpretava o repertório de Sade, encontra muita afinidade na artista britânico-nigeriana, com quem compartilha a mesma elegância, a mesma delicadeza no canto, a entrega na composição e na interpretação e destreza ao navegar pelos águas da música negra, africana, norte-americana e latina.

O álbum abre com a introdução instrumental “Genesis” que prepara bem o terreno e já nos faz mergulhar na atmosfera que vai se desenvolvendo nos momentos seguintes. Em “Karma” ouvimos a voz de Luedji pela primeira vez, mas de uma forma diferente, com uma interpretação mais encorpada, destacando os graves nos vocais.

Em “Kyoto” a baiana canta sobre o desejo de reencontra com um amor marcante que se manifesta em uma volta ao mundo. “Rota” se destaca pelo arranjo orquestral de peso para uma letra delicada, sobre se entregar a um romance. Em seguida vem uma regravação de “Dentro Ali”, faixa presente em “Um Corpo No Mundo” que ganha aqui uma bela nova roupagem, bem mais jazzística.

“4hz” é uma reprodução de um áudio de WhatsApp em que Luedji conversa com uma pessoa próxima sobre um relacionamento que está aquém do mínimo esperado:  “Eu só posso respeitar. Respeitar, não. Eu só posso rezar e rezar que você seja feliz. Dez anos ficando com a pessoa e [ele] não tem coragem de pedir em namoro, de fazer uma coisa que, enfim, toda mulher merece”, desabafa a cantora.

O áudio serve como introdução para “Harem” música em que a artista divide os vocais com Liniker que chega dando peso a canção e cantando versos que avisam: “Na boca da noite / O vento me trouxe notícia velha / Ele não presta / Tem quase um harém.” “Gamboa”, acrescenta pitadas de afrobeat ao jazz que também ganha contornos do samba.

“Jóia” anuncia o final do disco com um luxuoso com um sample de Luiz Melodia e citações de “Perola Negra”. “Baby te Amo” encerra com uma poesia póstuma da historiadora e intelectual negra Beatriz Nascimento (1942 – 1995), que aparece com uma voz recriada por inteligência artificial.

Luedji Luna faz um banquete de musicalidade, sensibilidade e afeto em “Um Mar Pra Cada Um”. Falando de amor e desejo com delicadeza e intimidade, a artista encerra a trilogia em alta e segue com uma trajetória artística impecável e muito particular em um álbum para ouvir prestando atenção em todos os detalhes. Explorando o jazz e o soul com elementos brasileiros e africanos, aliado ao lirismo fino das letras, a cantora segue uma das trajetórias artísticas mais bonitas da atualidade.

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