Crítica | Alien: Earth 1x3 – Metamorfose segue expandindo, mas tropeça nos protagonistas
FX/Divulgação

Crítica | Alien: Earth 1×3 – Metamorfose segue expandindo, mas tropeça nos protagonistas

O terceiro episódio de Alien: Earth, intitulado Metamorfose, chegOU carregando a responsabilidade de consolidar o que vinha sendo preparado nos capítulos anteriores. Criada por Noah Hawley, a primeira série televisiva ambientada no universo de Alien – até aqui – têm se mostrado ambiciosa: ao mesmo tempo em que emula a atmosfera dos filmes originais, introduz novas ideias sobre identidade, consciência e os limites da experiência humana. No entanto, este novo capítulo reforça uma contradição estrutural que já dava sinais desde o início: a fragilidade dos protagonistas frente ao vigor dos arcos secundários.

A narrativa se abre retomando o desfecho do episódio anterior: o resgate de Joe Hermit (Alex Lawther) e sua delicada condição após o confronto com o xenomorfo. Gravemente ferido, ele passa por uma cirurgia que remove um de seus pulmões, evento que se transforma em gatilho para uma das sequências mais perturbadoras da franquia. O jovem bilionário Boy Kavalier (Samuel Blenkin) e o sarcástico sintético Kirsh (Timothy Olyphant) aproveitam a oportunidade para implantar no órgão retirado um pequeno alienígena extraído de um ovo. A cena é grotesca, cruel e ao mesmo tempo fascinante, dialogando com a tradição de experimentos corporativos desumanos que sempre marcou a franquia.

Crítica | Alien: Earth 1x3 – Metamorfose segue expandindo, mas tropeça nos protagonistas
FX/Divulgação

Enquanto isso, Wendy (Sydney Chandler) emerge como a figura central da série, mas não exatamente da forma que deveria. Como híbrida – uma consciência infantil transplantada para um corpo sintético adulto –, ela carrega a complexidade de uma protagonista dividida entre a humanidade e a artificialidade. Neste episódio, no entanto, o roteiro insiste em reforçar sua conexão enigmática com os xenomorfos sem, contudo, aprofundar o suficiente para que esse elo se torne dramático. As dores, os espasmos e as reações ao som da criatura insinuam um potencial narrativo imenso, mas ainda pouco explorado.

E aqui surge a contradição que domina Metamorfose: enquanto a série exige que o público se importe com Wendy e Joe como centro emocional, a construção desses personagens se revela cada vez menos envolvente. O roteiro não oferece material suficiente para que a relação fraterna transcenda a superfície. O resultado é um núcleo principal que deveria carregar o peso dramático, mas que acaba sendo a parte mais frágil do episódio.

Em compensação, os arcos secundários seguem em expansão e se consolidam como os grandes trunfos da narrativa. O ciborgue Morrow (Babou Ceesay) é exemplo disso. Sua jornada interior, marcada pela tensão entre humanidade e artificialidade, entrega momentos densos, incluindo um monólogo que reflete sobre a contradição de sua existência. Mais do que vilão ou antagonista, ele encarna a tradição filosófica da franquia, que desde “O Oitavo Passageiro” até “Alien: Covenant” sempre lidou com questões existenciais em meio ao terror corporal.

Crítica | Alien: Earth 1x3 – Metamorfose segue expandindo, mas tropeça nos protagonistas
FX/Divulgação

Outro núcleo poderoso é o das crianças-sintéticas conhecidas como Lost Boys. O retorno a Neverland aprofunda o horror psicológico de mentes infantis presas em corpos adultos, um conceito perturbador que vai muito além do clichê de androides adquirindo humanidade. Nibs (Lily Newmark) surge em crise, incapaz de aceitar sua nova condição, enquanto Slightly (Adarsh Gourav) demonstra fragilidade diante das manipulações de Morrow. Essa diversidade de reações traz autenticidade à ideia e reforça a sensação de que Hawley não pretende se limitar a apenas replicar a fórmula da franquia, mas sim reinventá-la.

Visualmente, Metamorfose mantém o alto padrão já estabelecido. Os efeitos práticos e digitais trabalham em conjunto para criar criaturas tangíveis, com destaque para a cena em que Kirsh manipula o pequeno alienígena em laboratório. O design de produção também merece nota: Neverland continua sendo um espaço de beleza artificial que esconde podridão corporativa, e o interior da nave USCSS Maginot ainda evoca o retro-futurismo da Nostromo, honrando a herança estética da franquia.

Apesar desse cuidado visual e da densidade nos arcos paralelos, a condução de Hawley neste episódio pode soar previsível em termos de ambientação. A escolha de situar parte da ação em uma ilha isolada – a chamada Terra do Nunca – aproxima a série de uma espécie de “Jurassic Park com xenomorfos”. O confinamento geográfico pode ser eficiente para gerar tensão, mas ao mesmo tempo limita as possibilidades narrativas, tornando o cenário mais familiar do que inovador.

Ainda assim, Metamorfose cumpre seu papel de transição, ainda mais se situando bem no meio da temporada. Ele desloca a trama da nave Maginot para a ilha, estabelece a corrida corporativa entre Prodigy e Weyland-Yutani, e planta as sementes para desdobramentos maiores. É um episódio que aposta mais no desenvolvimento de atmosferas e dilemas do que em revelações imediatas, mostrando que Hawley prefere construir seu enredo em cadência lenta e calculada.

O problema é que, ao insistir em colocar Wendy e Joe no centro do tabuleiro, a série corre o risco de desperdiçar justamente os elementos mais ricos que tem à disposição. O drama existencial de Morrow, a psicologia instável das crianças-sintéticas, o cinismo de Kirsh e a megalomania de Boy Kavalier – tudo isso pulsa com muito mais força do que os conflitos dos protagonistas. A estrutura narrativa, portanto, balança, uma vez que, ao mesmo tempo em que há muito potencial em aberto, falta clareza sobre o que exatamente a série deseja que o espectador priorize.

O terceiro episódio de Alien: Earth é ao mesmo tempo frustrante e promissor. Frustrante porque insiste em reforçar os pontos mais fraco, mas promissor porque deixa à mostra o talento de Hawley em lidar com temas complexos, explorar o horror psicológico e construir um universo visualmente impressionante. A expectativa, agora, é que os próximos capítulos consigam equilibrar melhor esses elementos, entregando uma narrativa que não dependa apenas de criaturas ameaçadoras ou de metáforas corporativas, mas que consiga dar vida de fato aos personagens que deveriam estar no centro da trama.

Leia sobre os episódios anteriores:

Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor valvulado. Editor-chefe, crítico, roteirista, nortista e traficante cultural.