A minissérie Agatha: Desde Sempre seguiu a mesma fórmula de seu início ao encerrar a trama com dois episódios transmitidos simultaneamente, coincidindo com a véspera do Dia das Bruxas — desculpem pelo atraso com esta crítica.
Ao longo desses episódios finais, a série, que já havia mostrado seu potencial na construção de personagens e narrativas, encontrando um equilíbrio interessante entre simplicidade de linguagem e profundidade, oferecendo uma conclusão satisfatória, mas com algumas escolhas que nos lembram que esse ainda é um produto ultraprocessado da Marvel/Disney.
Mudança de tom estratégica
Após o impacto emocional do episódio anterior, “Se a Morte Me Encontrar”, era um desafio para Agatha: Desde Sempre manter o mesmo nível de envolvimento. O roteiro de Peter Cameron, ciente dessa dificuldade, faz uma transição cuidadosa entre os tons.
O primeiro ato do episódio final é marcado por uma abordagem minimalista e sombria, que se desenrola em um necrotério estilizado, iluminado por luzes arroxeadas — um visual carregado de tensão que evoca um ambiente de provação.
Esse espaço se torna o cenário onde Agatha (Kathryn Hahn) manipula os eventos, movendo as peças do jogo como uma mestra da estratégia. Essa abordagem contrasta com a batalha final cheia de luzes coloridas e confronto físico, um trope habitual em produções de super-heróis, mas que aqui serve a um propósito mais simbólico.
Embora a simplicidade do episódio inicial possa parecer superficial, ela na verdade, revela a habilidade de Agatha em manipular e controlar os outros. Ao longo dessa seção, ela não apenas afasta Jen do caminho, mas também começa a aplicar o plano que prometera: entregar Billy para a Morte. O jogo de palavras, onde Agatha revela segredos aparentemente inofensivos para manipular as circunstâncias, mostra uma vez mais sua maestria nas artes da enganação e do controle psicológico.
Vilania e ambiguidade
O episódio continua a explorar a complexa relação entre Agatha e seus “peões”, como Billy (Joe Locke). A simplicidade das cenas envolvendo Billy, em que ele aprende a guiar a alma mágica de Tommy para um novo hospedeiro, não deve ser vista como uma falha narrativa. Ao contrário, ela serve para ilustrar o jogo de manipulação em que Agatha se encontra.
A dúvida que Billy expressa sobre suas intenções — se ele está buscando apenas criar um novo corpo para Tommy ou se ele também está sendo manipulado pela mãe — adiciona uma camada de complexidade moral à trama. Agatha, com sua resposta fria (“meninos morrem”), reforça sua abordagem pragmática e distante, algo que deixa o público em suspense sobre suas reais intenções.
O embate final de poderes, com luzes e explosões mágicas, cumpre sua função como metáfora. A luta não é apenas entre Agatha e Morte, mas também um reflexo da luta interna de Agatha, que não é pura maldade, mas uma personagem que se vê à mercê de forças além de seu controle, como a Morte e seu próprio passado.
O contraste entre sua vilania e sua vulnerabilidade é o que torna sua personagem tão fascinante, e a série se utiliza disso para mostrar que, embora Agatha seja uma vilã, ela não é um monstro imbatível. Seu conflito com Morte, portanto, também simboliza o seu próprio medo e impotência diante do inevitável.
Manipulação de realidades
O ponto mais intrigante surge quando se revela que O Caminho das Bruxas é, na verdade, uma invenção de Agatha e seu filho Billy, remontando ao século XVIII. Esse flashback, aparentemente desconexo, ganha sentido ao explicar o surgimento da lenda que levou Agatha a matar bruxas ao longo dos séculos.
A ideia de que a magia que deu origem ao Caminho das Bruxas foi manipulada por Billy, com suas habilidades de alterar a realidade, traz uma reviravolta inesperada e coloca Billy no centro da narrativa. A série sugere, então, que talvez Billy, consciente ou inconscientemente, tenha sido o verdadeiro arquétipo de vilão, ou ao menos o catalisador dos eventos que levaram à morte de tantas bruxas ao longo dos anos.
Esse aprofundamento na manipulação de realidades e na construção do passado de Agatha não apenas enriquece o arco da personagem, mas também leva a uma nova leitura sobre o papel de Billy.
Ele, filho de Wanda, herda a magia do Caos, o que o torna um ser ainda mais poderoso e capaz de criar realidades alternativas. Esse conceito, que já havia sido insinuado em “WandaVision”, aqui ganha uma nova forma, deixando claro que a minissérie, mais do que contar a história de Agatha, está em grande parte recontando a história de Billy — talvez até de forma mais interessante.
A natureza de morte
No que diz respeito à figura de Morte, a série subverte a expectativa de que ela seja uma vilã convencional. Em vez disso, Morte é retratada como uma entidade neutra, que existe para cumprir seu papel, sem malícia.
A oferta de Morte para Agatha — salvar seu filho em troca de um “favor” — desencadeia o processo de paranoia da bruxa, que passa a se dedicar obsessivamente a manter Nicholas ao seu lado, utilizando as mortes de outras bruxas para aumentar seu poder e prolongar sua própria existência. A dúvida sobre as motivações de Agatha — se ela age por vingança ou por uma necessidade emocional doentia — nunca é totalmente esclarecida, o que, por um lado, é frustrante, mas também mantém o caráter misterioso da personagem.
O herdeiro de Wanda
O fechamento do arco de Billy é, sem dúvida, o ponto culminante da série. Sua evolução de personagem, de um jovem confuso e inseguro para alguém capaz de manipular a realidade com a mesma habilidade de sua mãe, é apresentada com uma carga emocional significativa. O momento em que Billy finalmente realiza que ele é responsável pelas mortes de bruxas e pela criação do Caminho das Bruxas é um ponto de inflexão crucial, simbolizando seu “batismo” como herdeiro de Wanda e de sua magia.
O trabalho de Joe Locke, ao incorporar os gestos e o estilo de Elizabeth Olsen como Feiticeira Escarlate, é uma das performances mais marcantes, especialmente no momento em que ele executa o feitiço no porão de Agatha. O confronto final com o fantasma de Agatha, embora não totalmente satisfatório, oferece uma resolução simbólica para a jornada de Billy e a transição de Agatha de vilã a personagem trágica.
Desfecho surpreendente?
Embora o episódio final tenha seus deslizes, como a falta de ousadia ao manter Agatha como uma presença fantasmagórica e o final um tanto aberto em relação a Tommy, Agatha: Desde Sempre se mantém uma série bem construída e cheia de reviravoltas.
O roteiro, a caracterização de personagens e a exploração de temas como manipulação, morte e magia dão profundidade a uma narrativa que, à primeira vista, poderia parecer uma mera exploração da vilania de Agatha. No entanto, ao focar em Billy como protagonista oculto da história, a série subverte as expectativas e entrega uma jornada envolvente, digna do legado de WandaVision.
No fim, Agatha: Desde Sempre não apenas conclui a história de Agatha Harkness, mas também usou a personagem-título como escada para abrir um novo capítulo para Billy, o verdadeiro herdeiro de Wanda, e o possível futuro da magia no Universo Cinematográfico Marvel.
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