O quarto capítulo de Alien: Earth, intitulado “Observação”, marca um ponto de virada dentro da primeira temporada da série criada por Noah Hawley. Diferente dos episódios anteriores, que priorizaram ação e suspense imediato, este se permite reduzir o ritmo para mergulhar em reflexões mais densas, usando como mote principal o horror biológico. A escolha pode soar arriscada, mas se mostra fundamental para expandir o universo da franquia e testar novos caminhos narrativos. O episódio não apenas apresenta uma das sequências mais desconfortáveis já vistas em Alien, como também insere uma revelação polêmica, capaz de dividir o público.
Hawley e o roteirista Bobak Esfarjani constroem Observação como um episódio de transição. É o momento em que os personagens e os espectadores precisam parar para avaliar as consequências dos experimentos da corporação Prodigy. O diálogo entre Arthur (David Rysdahl)e Dame Sylvia (Essie Davis) deixa isso explícito ao levantar a questão central: ao transferirem a consciência de crianças para corpos sintéticos adultos, os cientistas teriam criado inteligências artificiais que apenas acreditam ser humanas ou, pior ainda, teriam efetivamente condenado seis jovens à morte?
Esse dilema não é apenas ético, mas também filosófico. A série se vale de seu tempo de tela – cerca de oito horas ao longo da temporada – para introduzir debates que vão além da pura sobrevivência contra criaturas hostis. O dilema da humanidade dos Lost Boys é colocado lado a lado com a experiência de um novo e grotesco espécime, que se tornará rapidamente um dos pontos altos da produção.

O destaque do episódio é, sem dúvida, a aparição de The Eye, um alienígena inédito na franquia. Diferente dos tradicionais xenomorfos, esse ser é uma massa ocular cercada por tentáculos com ventosas, capazes de se fixar e invadir o corpo de suas vítimas. Sua presença não apenas causa repulsa imediata – afinal, mexer com olhos é sempre um gatilho de desconforto universal –, como também abre espaço para discussões temáticas alinhadas ao restante da narrativa.
A sequência em que Boy Kavalier (Samuel Blenkin) e Kirsh (Timothy Olyphant) permitem que o monstro infecte uma ovelha se torna o momento mais perturbador do episódio. O animal, interpretado parcialmente por uma ovelha real em cena, passa a exibir um olhar vazio e onisciente que é puro pesadelo. Como afirmou o próprio Hawley em entrevista, cada melhoria nos efeitos visuais aumentou exponencialmente o desconforto da cena. O detalhe de o animal real recuar da câmera, como se estivesse de fato reagindo ao terror, deu um realismo arrepiante à filmagem.

Visualmente, o design de The Eye passou por ajustes até chegar à versão final. A sugestão de adicionar ventosas e mobilidade própria, segundo Hawley, elevou o impacto. Se antes a criatura precisava apenas correr, agora ela consegue se lançar contra suas vítimas, aderir aos corpos e dominá-los. A comparação com baratas voadoras feita pelo criador é precisa: algo já repulsivo se torna ainda mais desesperador quando ganha asas ou tentáculos.
Além do choque visual, o episódio utiliza The Eye como metáfora direta para o tema da autonomia. Quando a criatura toma o controle da ovelha, a questão central do episódio ganha um novo espelho: até que ponto somos donos de nossos corpos e mentes? Essa pergunta ecoa o próprio dilema dos Lost Boys, jovens cuja consciência foi transportada para hospedeiros artificiais.
Enquanto Kavalier enxerga na experiência uma confirmação científica – uma entidade que preserva sua essência mesmo em outro corpo –, o episódio sugere que o cientista não reconhece o mesmo valor humano nos garotos usados em seus experimentos. Essa arrogância remete a arquétipos clássicos de personagens que subestimam as consequências de brincar de Deus, de Ícaro à tradição dos vilões da ficção científica.
Se a sequência com a ovelha já é forte, o episódio reserva ainda uma revelação que pode mudar completamente a percepção da temporada. Wendy (ou Marcy, como alguns acreditam ser sua verdadeira identidade), interpretada por Sydney Chandler, demonstra a habilidade de se comunicar com um xenomorfo. A ideia de uma espécie de “sussurradora de alienígenas” pode causar estranhamento, mas faz sentido dentro do universo estabelecido.

Há precedentes na franquia: em “Aliens”, a Rainha claramente transmite ordens aos drones durante o confronto com Ripley, indicando uma forma de comunicação entre as criaturas. O que Observação faz é expandir esse conceito para um elo direto entre humano e xenomorfo. Para além da polêmica, a conexão entre Wendy e o monstro reforça o paralelo temático do episódio: ambos são seres que precisaram de corpos hospedeiros para existir, vivendo estágios de desenvolvimento semelhantes.
Apesar de levantar questões instigantes, o episódio às vezes peca por entregar respostas muito rápidas. Em vez de manter a ambiguidade sobre a identidade dos Lost Boys, a narrativa frequentemente se inclina para validar que eles são, de fato, as crianças originais em novos corpos. Essa escolha pode reduzir o impacto de uma discussão que teria potencial para sustentar a temporada inteira.
Ainda assim, o saldo é positivo. O ritmo mais contemplativo não anula o choque das imagens, e a ousadia de introduzir elementos inéditos sem abandonar o DNA da franquia merece destaque. É uma estratégia de Hawley segue a mesma: misturar fórmulas conhecidas a ingredientes novos, equilibrando familiaridade e inovação.
O 4º episódio da série honra seu título ao pausar a trama para observar. Observa as consequências da ciência de Prodigy, observa as possibilidades narrativas da franquia e observa até onde o público está disposto a seguir quando a ficção científica flerta com o grotesco. Com um experimento que envolve uma ovelha de olhar hipnótico, a estreia de uma criatura memorável e uma revelação ousada sobre Wendy, o episódio pode ser visto tanto como um ponto alto da temporada quanto como um divisor de águas para os fãs.
Alien: Earth ganha novos episódios da série, às terças, exclusivamente, na Disney+.
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