Crítica | Invencível 3x6: O peso da culpa e o ciclo da vingança

Crítica | Invencível – 3×6: O peso da culpa e o ciclo da vingança

O episódio 6 da 3ª temporada de Invencível, intitulado “Só Posso Pedir Desculpas”, é mais um daqueles momentos de equilíbrio da ação frenética com profundidade emocional, já característicos da série. A narrativa começa com um flashback que nos leva de volta ao fatídico dia em que a luta entre Omni-Man e Mark devastou Chicago. A animação, que já é conhecida por seu estilo gráfico e visceral, usa cores escuras e sombras pesadas para transmitir a atmosfera de caos e desespero. A cena é um lembrete brutal de que, por trás dos socos e rachaduras no chão, há vidas sendo destruídas.

É nesse contexto que conhecemos Scott Duvall, um homem comum cuja vida foi arruinada pela batalha entre pai e filho. A perda de sua irmã e sobrinha o transforma em Powerplex, um vilão movido por dor e sede de vingança. A construção de Scott como antagonista é uma das grandes virtudes do episódio. Ele é um produto das falhas do sistema e da indiferença dos poderosos. Sua motivação é tão compreensível quanto trágica, e isso o torna um dos personagens mais interessantes da temporada ate aqui.

A animação, aliás, merece um destaque especial. A série utiliza técnicas que misturam 2D e 3D, criando uma estética que combina fluidez com impacto. As cenas de luta são coreografadas com precisão, mas o que realmente impressiona é como a direção de arte consegue transmitir emoção através dos detalhes. Por exemplo, a expressão de Scott ao ver sua família morrer é desenhada com traços angulares e cores frias, enquanto o olhar de Mark, carregado de culpa, é retratado com tons mais suaves, quase como se ele estivesse sempre à sombra de seu próprio passado.

O roteiro, por sua vez, segue sendo muito preciso em adaptar o texto do Kirkman o formato seriado, desenvolvendo os personagens sem perder o ritmo da trama. Enquanto acompanhamos a jornada de Scott, também vemos Mark lidando com as consequências de suas ações. Ele não é mais o herói ingênuo da primeira temporada; agora, ele carrega o peso de milhares de vidas perdidas. A série não poupa seu protagonista, e isso é algo raro em histórias de super-heróis. O episódio coloca Mark em um lugar vulnerável, onde ele precisa confrontar não apenas seus inimigos, mas também sua própria consciência.

Um dos momentos mais marcantes é quando Mark e Eve supervisionam Oliver, o meio-irmão thraxano de Mark, em sua primeira missão solo. A cena é uma alegoria clara sobre a passagem da inocência para a maturidade. Oliver, ainda jovem e idealista, luta contra o Elefante, um vilão cuja causa – fazer todos virarem veganos – é quase cômica, mas serve como contraponto à seriedade da situação. A animação aqui é mais leve, com cores vibrantes e movimentos exagerados, refletindo a inexperiência de Oliver.

No entanto, a conversa que se segue entre Mark, Eve e Oliver é onde o episódio realmente brilha. Eles discutem Nolan, o pai de Mark e Oliver, que é ao mesmo tempo um herói e um genocida. A série nos faz questionar: é possível redimir alguém que cometeu atrocidades?

Essa ambiguidade moral é um dos pilares de Invencível, e ela se reflete em outros personagens também. Paul, por exemplo, o namorado de Debbie, luta para encontrar seu lugar em um mundo de super-heróis. Sua cena com Debbie, onde ele expressa suas inseguranças, é um momento de humanidade raro em meio ao caos. A animação aqui é mais contida, com planos fechados e cores quentes, destacando a intimidade da conversa. É uma escolha inteligente, pois contrasta com as cenas de ação e reforça a ideia de que, no fim do dia, todos são apenas pessoas tentando sobreviver.

Enquanto isso, Scott, agora como Powerplex, continua sua busca por vingança. Sua luta contra Supermofo, um dos Guardiões do Globo, é uma das cenas mais impactantes do episódio. A animação usa efeitos de luz e sombra para destacar os poderes elétricos de Scott, criando uma sensação de perigo iminente.

No entanto, o verdadeiro clímax ocorre quando Scott confronta Mark no memorial das vítimas de Chicago. A cena é carregada de simbolismo: o memorial representa o passado que Mark tenta esquecer, mas que Scott não pode perdoar. A luta entre os dois é rápida, mas intensa, e termina com Scott perdendo o controle de seus poderes e matando acidentalmente sua própria família. É um momento devastador, tanto para os personagens quanto para o público, e reforça o tema central do episódio: a violência gera mais violência, e o ciclo parece nunca ter fim.

O episódio também dá continuidade a outras tramas secundárias, como a relação entre Rudy e Amanda. A cena em que Rudy cria um cinto para impedir que Amanda rejuvenesça toda vez que se transforma em Menina Monstro é um respiro necessário em meio ao drama.

Por fim, o episódio nos leva a Angstrom Levy, o vilão que está reunindo um exército de Marks de diferentes universos. A cena final, onde vemos Levy observando Mark através de um drone, é perturbadora e um lembrete de que, por mais que Mark tente se redimir, seu passado sempre o alcançará.

Só Posso Pedir Desculpas é um episódio que consegue ser ao mesmo tempo uma crítica social, um estudo de personagem e um espetáculo visual. A série não tem medo de explorar temas difíceis e sua classificação enquanto uma animação adulta é justificada muito mais justificada nesses momentos do que quando ocorre um grande derramamento de sangue.

E assim, o ciclo se fecha: começamos com a destruição causada por Mark e terminamos com ele tentando, mais uma vez, consertar o que foi quebrado. Mas, como o episódio nos lembra, nem tudo pode ser consertado. E talvez seja essa a lição mais dolorosa de todas.

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Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor valvulado. Editor-chefe, crítico, roteirista, nortista e traficante cultural.