Em Na Teia da Aranha (Cobweb, 2023), o diretor sul-coreano Kim Jee-woon constrói uma experiência cinematográfica alucinada e metalinguística que mergulha no caos criativo de um cineasta em crise, em plena Coreia do Sul dos anos 1970. Com uma abordagem que mistura sátira, homenagem e desespero artístico, o longa é um verdadeiro espetáculo de bastidores, uma carta de amor (e ironia) ao próprio ato de fazer cinema.
O enredo gira em torno de Kim Ki-yeol (vivido por Song Kang-ho, vencedor de Cannes por “Broker”, 2022), um diretor obcecado em refilmar o final de seu longa-metragem já concluído. Convencido de que está prestes a transformar sua obra em uma verdadeira obra-prima, ele tem apenas dois dias para regravar a sequência final, tudo isso escondido dos censores militares e em meio a um set em colapso, entre vaidades, tensões e delírios criativos.
A performance de Song Kang-ho é magnética, navegando com maestria entre o colapso emocional e o humor farsesco. O elenco de apoio (que inclui Lim Soo-jung, Oh Jung-se, Jeon Yeo-been e Krystal Jung) reforça o clima de tragicomédia com atuações que transitam entre o caricatural e o genuíno.

Visualmente, o filme é um show à parte. Kim Jee-woon aposta em uma direção ousada, com alternâncias entre cenas em preto e branco (que representam a estética idealizada do filme dentro do filme) e as sequências em cores (a realidade caótica da produção). A montagem afiada de Yang Jin-mo (“Parasita”, 2019) e a trilha sonora pulsante de Mowg sustentam o ritmo frenético, criando um equilíbrio preciso entre tensão e humor absurdo.
Além de sua estética marcante, Na Teia da Aranha dialoga diretamente com o contexto político da Coreia do Sul na década de 70, marcada por forte censura e repressão. A crítica à ditadura militar e à limitação da liberdade artística ecoa de forma surpreendentemente atual, ampliando a relevância do longa.
Entre o comentário político, a homenagem cinéfila e o caos performático dos bastidores, Kim Jee-woon entrega uma obra vibrante, inteligente e fora do comum. Na Teia da Aranha é, ao mesmo tempo, uma comédia satírica, um drama sobre obsessão artística e um estudo visual sobre o conflito entre ideal e realidade.

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