Sob os céus azuis de Marselha, começa uma história de injustiça e vingança, nascida do coração da literatura clássica. Na versão da dupla francesa Matthieu Delaporte e Alexandre de la Patellière para o imortal romance de Alexandre Dumas, O Conde de Monte Cristo ganha vida novamente, mas agora com o frescor de um filme moderno que, ao mesmo tempo, respeita a grandiosidade do original. A obra é um convite para mergulhar em quase três horas de pura emoção, sem perder o fôlego.
O filme nos transporta para 1815, quando Edmond Dantès (Pierre Niney), um jovem marinheiro apaixonado e cheio de promessas, é traído por aqueles em quem mais confiava. Condenado injustamente e jogado no sombrio Castelo de If, ele definha por 16 anos até renascer das trevas, armado com conhecimento, riqueza e um propósito: a vingança. É aqui que o espectador embarca em uma jornada de escuridão e redenção, guiado por uma narrativa que ecoa os dilemas eternos da humanidade.
O roteiro é um dos grandes trunfos desta adaptação. Ao mesmo tempo em que se mantém fiel à essência do romance, ele toma liberdades ousadas para modernizar e tornar a trama ainda mais intrigante. Novos personagens, laços inesperados e ajustes nos contextos sociais ajudam a construir uma história que dialoga com o público contemporâneo, sem perder o peso dramático e a grandiosidade que fizeram de O Conde de Monte Cristo um clássico atemporal.
Mas toda boa história precisa de rostos que a contem. E que elenco! Pierre Niney entrega uma atuação multifacetada, alternando entre o jovem sonhador e o vingador consumido pelo ódio. Cada expressão, cada gesto revela as camadas de um personagem que evolui a cada cena. Ao seu lado, Bastien Bouillon, Patrick Mille e Laurent Lafitte brilham como os antagonistas, oferecendo performances que equilibram o cinismo e a complexidade de seus papéis.
A direção de Delaporte e de la Patellière é cuidadosa, mas não sem ousadias. Com uma abordagem visual que alterna momentos intimistas e explosões de grandiosidade, o filme captura tanto o drama humano quanto o espetáculo megalomaníaco que a trama pede. Há, no entanto, um uso um tanto excessivo de drones em algumas cenas, que, embora impressionantes, por vezes distraem mais do que contribuem para a narrativa.
A trilha sonora, sempre presente, é quase um personagem por si. Em muitos momentos, ela amplifica o impacto emocional, mas em outros parece querer roubar a cena, soando um pouco intrusiva. Ainda assim, há trechos em que a música se alinha perfeitamente ao tom sombrio e melancólico da jornada de Edmond, elevando a experiência.
O figurino e a direção de arte merecem aplausos à parte. Cada detalhe – dos trajes de época aos cenários majestosos – transporta o público diretamente para o início do século XIX. É como caminhar pelas ruas de Marselha, sentir o frio úmido das masmorras do Castelo de If ou admirar a opulência dos salões onde a vingança é tramada.
Mas talvez o maior mérito do filme seja sua capacidade de explorar o lado mais sombrio do ser humano. A sede de vingança de Edmond Dantès, embora legítima, é também corrosiva, transformando o herói em alguém quase irreconhecível. Essa dualidade é explorada com maestria pelos diretores, que nunca deixam o espectador esquecer que, por trás da máscara do Conde, há um homem profundamente ferido.
Nem tudo, contudo, é perfeito. Alguns atalhos no roteiro podem frustrar aqueles que conhecem bem a trama original, e certas cenas parecem apressadas demais, como se o filme tentasse abarcar tudo sem dar o devido tempo para respirar. Ainda assim, esses pequenos deslizes não tiram o brilho da produção como um todo.
O Conde de Monte Cristo de Delaporte e de la Patellière cumpre sua missão de ser um espetáculo grandioso e acessível. É um filme que não apenas homenageia o legado de Alexandre Dumas, mas o reinventa para um novo público, mostrando que histórias de traição, vingança e redenção nunca perdem sua relevância.
Sob a máscara do Conde, vemos refletido não apenas o sofrimento de um homem, mas também as dores e esperanças de todos nós. Afinal, quem nunca sonhou em transformar a dor em força e o revés em vitória? Este é o grande triunfo deste filme: lembrar-nos de que, mesmo nas sombras mais profundas, há espaço para renascimentos.
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