Anthony Miller (Russell Crowe) como padre em O Exorcismo. | Foto: Reprodução/Divulgação
Anthony Miller (Russell Crowe) como padre em O Exorcismo. | Foto: Reprodução/Divulgação

Crítica | O Exorcismo desbanca clássico com bastidores tão ‘reais’ quanto os da ficção

“Proposta para atores: interpretar um padre em meio período”. Um astro do cinema e um clássico do terror. Às telas, O Exorcismo, do diretor Joshua John Miller (“The Final Girls”, 2015). Na criação temática, conhecemos Anthony Miller (Russell Crowe) um ator problemático, que viveu traumas na igreja e com vícios, que busca se recolocar na atuação por meio de um filme de exorcismo. 

A filha Lee Miller (Ryan Simpkins) é responsável por esmiuçar o passado do pai, a quem se refere como Tony. A partir daí, percebe-se a relação familiar conturbada. Sem mãe e expulsa da escola, a jovem é acometida pelo comportamento cada vez mais estranho do veterano. Decidida a ajudá-lo, tanto profissionalmente quanto pessoalmente, a personagem conta com a ajuda de Padre Conor (David Hyde Pierce) – que acompanha as gravações e vê a influência narrativa do longa com os acontecimentos infelizes da vida de Anthony. 

Paralelamente, Lee vive um breve romance com Blake Holloway (Chloe Bailey). Um certo respiro, talvez, para a carga narrativa, mas que não tem qualquer poder sobre o encaminhamento da história. As duas, no entanto, são as que testemunham a possessão de Tony e agem juntas para encontrar uma solução ao caso.

Lee Miller (Ryan Simpkins) e Blake Holloway (Chloe Bailey) em O Exorcismo. | Foto: Reprodução/Divulgação
Lee Miller (Ryan Simpkins) e Blake Holloway (Chloe Bailey) em O Exorcismo. | Foto: Reprodução/Divulgação

Mais um filme sobre Exorcismo?!

Pois então, este terror “de-um-título-só”, sintético e universal, relê a dualidade por meio de testes e ensaios de um bastidor inteiramente exposto. À cena, o set é formado por caixas colossais como réplica das casas de bonecas. O brinquedo soma ao caráter teatral à medida em que o ator se torna a peça principal da performance. Isso porque seu protagonismo se desenvolve em quatro dimensões: o líder da narrativa do filme; o ator de cinema; o ex-dependente de drogas que vive problemas de relacionamento com a filha; e o que guia a história: a jornada do herói em busca de sua redenção.

À lá O Exorcista, Anthony ensaia incorporar o padre que fará o ritual. Os cortes mesclam a leitura das estrofes com as confissões de seu passado megero. Em cena, ao dizer e performar as palavras, o personagem prende o ator em sua realidade infeliz. Assim, o horror psicológico intensifica-se cada vez mais à penumbra do terror que, de menos, aterroriza. 

Explorar as expectativas do público diante da carga significativa da obra – que remete a um Blockbuster – me soa cansativo, mas também atrevido. O diretor Joshua Miller que, vale lembrar, é filho de Jason Miller, que interpretou o padre no clássico de 1973, subverte a praxe do ritual cinematográfico com uma autorreferencialidade exagerada. Embora o ponto interpretativo seja bacana por nos tornar testemunhas dos eventos da gravação e da possessão gradativa de Anthony, o filme é muito despretensioso. Se apoia inteiramente no terror religioso e apenas segue uma série de convenções: fragilidade, medo, conflito e, de praxe, o ritual.

 Russell Crowe como Anthony Miller em O Exorcismo. | Foto: Divulgação/Reprodução
Russell Crowe como Anthony Miller em O Exorcismo. | Foto: Divulgação/Reprodução

Fotografia

Para isso, o uso de planos fechados captam a expressão facial de Anthony. Os ângulos, de certa forma premeditados, remetem a uma aflição fotográfica que manipula o sentimento do espectador. A exemplo, há horas em que Tony está iluminado, envolto por uma delicadeza que expõe, de fato, sua vulnerabilidade ao se confessar para um padre; e em outras, encoberto por tons frios e escuros que revelam a sua outra “face”. A dualidade é novamente pautada, mas agora, guiada pela emoção. 

Este abalo é ilustrado por cores pungentes em grande parte dos ambientes, como o apartamento, o set de gravação com o misterioso frigorífico – em que ocorre o ritual de possessão. Como parte do “pacote”, alçam o terror os rangidos de porta, os passos no assoalho, aparições misteriosas e a escuridão interrompida por faíscas repentina. Aos poucos somos apresentados ao que causava medo e remorso ao protagonista. E também, somos convidados a entender os surtos de um homem complexo que teme a si próprio. Todo o incentivo fatigante endossa as cenas dinâmicas que desembocam no clímax: o Horror.

Horror nos bastidores

Tanto a Igreja Apostólica Romana como a Protestante acreditam na possessão demoníaca e praticam um ritual de expulsão dos espíritos. Na Católica, há três tipos de Exorcismo, em que o Real, expulsa Lúcifer e seus anjos do ser humano. Como na realidade, Padre Conor investiga o caso de Tony e estabelece que há uma entidade no personagem. Então, ele se une à Lee e à Blake em um ritual de libertação da alma de Miller. 

Embora Lee contribua para acessar a alma de seu pai, a disputa e a expulsão da entidade do corpo é feita entre Conor e Lúcifer. A narrativa busca trazer os eventos que, coincidentemente ou não, ocorrem nos bastidores de um filme de terror – a exemplo, os fatos terríveis de O Exorcista. Fazendo jus ao tema forte e ao estrondoso procedimento, o desenlace liberta, finalmente, a energia e a tensão que foi sendo construída desde o princípio do longa. Decisão tão previsível quanto o seu título de estreia que irá compor a famigerada lista do gênero.

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Jornalista, Repórter de Cultura Pop e Crítica de Cinema | contatoliviasc@gmail.com