Descobri o Arcade Fire relativamente tarde, por volta de 2016, e foi amor à primeira audição. Assistir aos shows da banda – aquela energia contagiante, a grandiosidade orquestral, a entrega visceral de Win Butler e a presença magnética de Régine Chassagne – me fez prometer a mim mesmo: um dia, eu os veria ao vivo. Eles pareciam a última grande banda de indie rock capaz de unir crítica e público, herdeiros de uma era em que discos como “Funeral” (2004) e “The Suburbs” (2010) eram não apenas álbuns, mas experiências coletivas. Mas então veio “Everything Now” (2017), um tombo criativo. Depois, “WE” (2022), ainda mais morno. E agora, Pink Elephant, um trabalho que não só confirma a decadência, mas a transforma em algo quase trágico.
O novo álbum da banda soa como se eles já não soubessem mais para onde ir. A produção, assinada pelo próprio Butler junto a Nigel Godrich (conhecido por seu trabalho com Radiohead e Beck), é competente tecnicamente, mas falta alma. Há camadas de sintetizadores, batidas eletrônicas e texturas ambientes que, em teoria, poderiam soar revigorantes. Na prática, porém, tudo soa genérico, como se a banda estivesse tentando emular tendências atuais sem conseguir imprimir sua identidade. Comparado à riqueza de arranjos de “Neon Bible” ou à urgência emocional de Funeral, Pink Elephant parece ter sido feito no piloto automático.
A abertura, “Open Your Heart or Die Trying”, é um instrumental que não estabelece clima nem propósito. Segue-se a faixa-título, que tenta ser grandiosa, mas soa apenas repetitiva, com letras que beiram o clichê (“We’re dancing on the edge of time”). A melodia é plana, e a performance vocal de Win Butler – outrora carismática e extremamente emocional – soa cansada, como se ele estivesse apenas cumprindo tabela. Régine Chassagne, sempre um dos pontos altos da banda, aparece pouco, e quando surge (como em “Year of the Snake”), seu potencial é desperdiçado em refrões que não evoluem.
Um dos maiores problemas de Pink Elephant é a falta de direção. O álbum oscila entre tentativas falhas de dance-rock (“Circle of Trust”) e baladas sem impacto (“Ride or Die”), sem que nenhum dos momentos se conecte. “Alien Nation” é particularmente constrangedor: a letra (“I’m an alien, just like you”) parece escrita às pressas, e a tentativa de misturar guitarras distorcidas com eletrônica soa artificial. Até os momentos que poderiam brilhar, como “She Cries Diamond Rain” (uma bela faixa instrumental, curta e atmosférica), são exceções que só destacam o quão sem graça o resto do disco é.

A estrutura das músicas também peca por excesso de repetição e falta de desenvolvimento. “I Love Her Shadow” começa com uma ideia interessante – um groove suave, vocais sussurrados – mas se arrasta por cinco minutos sem surpresas. “Stuck in My Head”, a faixa de encerramento, tenta ser épica, mas os sete minutos de duração só evidenciam a carência de ideias melódicas fortes.
E, claro, há a questão lírica. Arcade Fire já foi uma banda que sabia falar sobre solidão, perda e esperança de forma poética. Aqui, as letras são ou vagas (“It’s the season of change”) ou tão literais que beiram o ridículo (“It’s a mess in my bedroom”). Butler, que antes transmitia emoção genuína, agora soa como um personagem caricato de si mesmo.
É difícil não sentir um luto musical ao ouvir Pink Elephant. Não apenas porque o disco é fraco, mas porque ele parece enterrar de vez a esperança de que o Arcade Fire ainda possa resgatar seu antigo brilho. Se Everything Now foi um tropeço e WE um suspiro morno, este novo trabalho é a confirmação de que a banda perdeu o fogo que um dia a definiu. Talvez seja hora de aceitar: o Arcade Fire que conhecemos e amamos já não existe mais. E, infelizmente, Pink Elephant é seu epitáfio.
Leia sobre outros discos:
- Crítica | Papatinho mostra a força do legado do funk em ‘MPC (Música Popular Carioca)’
- Crítica | Jadsa mergulha num ‘big buraco’ e ressurge com o melhor disco de 2025 até aqui
- Crítica | Miley Cyrus entrega rock, ousadia e menos apelo pop em ‘Something Beautiful’
Deixe uma resposta