Paramount Pictures/Divulgação

Crítica | Sonic 3 : velocidade, nostalgia e algumas curvas inesperadas

O que parecia uma maldição sem fim para as adaptações de videogames, finalmente começa a mostrar sinais de redenção – Sonic 3 – O Filme é um ótimo exemplo disso. Depois de um começo conturbado, com a reação de fãs ao design do Sonic em sua primeira aparição do personagem num teaser, a franquia se reergueu, oferecendo uma sequência divertida e recheada de fan service, que agradou aos fãs dos jogos e também ao público infantil. O filme segue uma fórmula já conhecida, com uma boa dose de ação, personagens novos e a introdução de Shadow, um dos personagens mais amados da série.

A maior atração de Sonic 3, sem dúvida, é a introdução de Shadow, o ouriço misterioso, poderoso e cheio de raiva devido a um passado traumático. O contraste entre Shadow e os outros heróis é perceptível, trazendo uma energia diferente para a trama. O personagem carrega um peso emocional que fica evidente nas interações com Sonic. Não há dúvida de que Shadow é uma das melhores adições à franquia até o momento.

A dinâmica entre Sonic, Tails e Knuckles também continua forte. A química entre os três personagens, bem estabelecida desde o primeiro filme, é um dos pontos altos da série. Knuckles e Tails, mesmo com o tempo de tela reduzido, conseguem transparecer que entre o 2º e 3º filme, eles estão mais entrosados, seja como uma equipe em batalha, mas também na relação familiar.

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Os personagens humanos acabam sendo ofuscados pela ação frenética e pelo carisma dos heróis e vilões animados. Tom e Maddie, interpretados por James Marsden e Tika Sumpter, seguem como a âncora emocional da trama, mas seus papéis são reduzidos a figurantes, pouco envolvidos na evolução do enredo. A presença deles, embora simpática, é quase um pano de fundo, enquanto a verdadeira dinâmica se desenrola entre Sonic, Shadow e os outros personagens do universo do ouriço. Mesmo em momentos chave, os humanos são usados mais para amarrar algumas pontas soltas do que para realmente impulsionar a narrativa. O mesmo vale para os personagens de Lee Majdoub e Krysten Ritter.

Jim Carrey

Mas, se o filme acerta ao dar protagonismo a Shadow e explorar sua origem de maneira mais fiel ao universo dos jogos, a verdadeira dor de cabeça vem da tentativa de Jim Carrey de dar uma performance dupla – ou seria exagerada? O ator, como o excêntrico Dr. Robotnik e seu antepassado Gerald Robotnik, faz o que sabe de melhor: ultrapassa todos os limites da caricatura e do humor exagerado. No entanto, aqui, o que deveria ser engraçado acaba se tornando irritante.

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É difícil não fazer uma comparação com Eddie Murphy em alguns de seus papéis mais recentes, onde o ator tenta multiplicar sua própria performance e acaba exagerando no tom. No caso de Carrey, esse esforço em entregar duas versões de seu personagem é um tanto confuso, e por mais que o ator ainda saiba se entregar a momentos de pura humor pastelão, ele parece perdido entre a tentativa de manter o tom engraçado e não parecer completamente descontrolado. A sequência de dança entre Robotnik e Gerald numa sala de lasers, mais do que sem graça, soa como um desperdício de tempo, sem oferecer real contribuição à trama.

O filme, no entanto, não deixa de ter suas qualidades. A ação é frenética, com várias cenas de perseguição e batalhas épicas, como a luta entre Sonic e Shadow, que lembra algo de Dragon Ball Z ou até das batalhas dos kryptonianos em “O Homem de Aço”.

As cenas de ação estão visualmente impressionantes, e o filme faz jus ao seu status de franquia de entretenimento familiar, sabendo exatamente o que o público espera: diversão, emoção e boas risadas. As piadas, mesmo sendo direcionados ao público mais jovem, não deixam de acertar em alguns pontos, como na interação entre Knuckles e seu marshmallow tostado, que traz um toque de leveza ao filme.

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Shadow

A história de Shadow é um verdadeiro tributo aos anos 2000, com sua aura de rebeldia e angústia, refletindo o espírito da época, marcada pela busca de identidade e pela influência estilística do nu metal. Seu caráter sombrio, introspectivo e cheio de raiva, aliada a uma atitude quase desinteressada, ressoa profundamente com fãs que cresceram nesse período, especialmente aqueles com mais de 30 anos, que viveram a juventude imersos em uma cultura que celebrava a rebeldia e a busca por redenção através da dor. Shadow é, sem dúvida, uma representação nostálgica e carismática dessa era.

Evidentemente não estamos falando de um personagem super complexo, mas ele não deixa de ser um bom instrumento de como o filme explora temas como vingança e redenção, apresentando um personagem impulsionado pelo ódio e pela dor do passado, mas que, ao longo da história, busca compreensão e transformação. Aliás, Alyla Browne como Maria Robotnik, é uma grata surpresa. Ela funciona como catalizador para o trauma de dois personagens em perspectivas diferentes.

Crítica | Sonic 3 : velocidade, nostalgia e algumas curvas inesperadas
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A jornada de Shadow reflete a ideia de que o afeto e a aceitação podem mudar até os mais amargos inimigos. A redenção também é um tema recorrente em outros personagens, como o próprio Robotnik, que, mesmo com seus traços de vilão, acaba sendo colocado em uma posição onde suas motivações e ações são reavaliadas, em mais uma demonstração da busca por um propósito maior que transcende o rancor.

Dublagem

Vale ressaltar que a versão que assistimos na cabine de imprensa foi dublada, com isso não podemos nos aprofundar sobre o trabalho da dublagem em inglês, que nesse terceiro longa contou com a adição de Keanu Reeves, como Shadow. No entanto, a notícia positiva é que o trabalho de dublagem brasileiro merece destaque, com Manolo Rey, Vii Zedek e Ronaldo Júlio entregando um interessante contraste de vozes e personalidades entre o trio principal. Já o Shadow contou com a voz de Reginaldo Primo, que fez o personagem em algumas produções, como as animações “Sonic X”“Sonic Boom” e “Sonic Prime”.

Sonic 3 é para crianças, mas poderia fazer mais

No entanto, é difícil ignorar a sensação de que, por mais divertido que seja, o filme se repete um pouco. A fórmula não muda muito e, como esperado, o vilão acaba sendo transformado em anti-herói – uma história de redenção que já vimos em tantas outras produções e no próprio capítulo antecessor dessa franquia. Mesmo com os visuais e os momentos épicos, a narrativa parece estar à espera de algo mais ousado, algo que pudesse quebrar a previsibilidade e trazer um frescor para o enredo.

O filme, sem dúvida, tem seu valor – e para os fãs mais ardorosos da franquia Sonic, provavelmente será mais uma diversão garantida. A adição de uma cena ao som de “Live and Learn”, uma das canções mais populares entre os fãs do ouriço, e as duas cenas pós-créditos já acenam para o que vem pela frente, e a continuidade da franquia parece garantida, principalmente com a adição de personagens importantes do universo dos games. Mas, enquanto o filme tenta expandir seu universo e agradar uma audiência mais ampla, ele parece se apoiar cada vez mais em fórmulas familiares e não tão ousadas.

Sonic 3 é um ótimo filme para as crianças, repleto de ação, humor e personagens cativantes. Mas, para os mais velhos, especialmente os fãs da franquia dos games, fica a sensação de que a nostalgia e os momentos de fan service são mais atraentes do que o filme em si. Para alguns, só isso é o suficiente – mas mesmo para alguém que tem o Sonic como primeiro herói dos games, sinto que o ouriço está perdendo o fôlego correndo em círculos pelo mesmo circuito.

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Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor valvulado. Editor-chefe, crítico, roteirista, nortista e traficante cultural.