Donald Sutherland faleceu na quinta-feira, 20 de junho, aos 88 anos de idade
“Esperança é a única coisa que é ainda mais forte que o medo.” E é com essa frase, de um dos seus personagens mais icônicos, que iniciamos agora esse especial sobre a vida e obra da lenda do cinema: Donald Sutherland.
Na cidade portuária de Saint John, localizada na província de New Brunswick (Canadá), em 17 de julho de 1935 nascia Donald McNichol Sutherland. Tendo vivido em Hampton e Nova Escócia, com seus 14 anos de idade já estabelecia um marco na história canadense. Na época, Donald se tornava o locutor e repórter mais jovem em atividade através da rádio local CKBW, onde trabalhava por meio período.
O começo da carreira… e do vício
A década de 50 marca o início da carreira de Donald Sutherland no teatro, através da Hart House Theatre onde esteve presente em peças como “The School of Wives” (1956) e “The Tempest” (1957).
Neste período também, em 1958, Sutherland se formou na Victoria College, uma universidade localizada em Toronto, com dupla graduação: engenharia e teatro. Pouco tempo depois, se mudou para Inglaterra onde ingressou na Academia de Londres de Música e Arte Dramática.
Chegando aos anos 60, Donald realiza as suas primeiras aparições na televisão como nas séries “The Odd Man” e “The Sentimental Agent“, ambos de 1963, e também surge em filmes de suspense e terror como em “O Castelo dos Mortos Vivos” (1964), longa dirigido por Warren Kiefer e Luciano Ricci, que também contava com Christopher Lee (da franquia “O Senhor dos Anéis” e “O Hobbit“) no elenco.
“As Profecias do Doutor Terror” de Freddie Francis, “Fanatismo Macabro” de Silvio Narizzano e “O Caso Bedford” de James B. Harris, todos lançados em 1965, são outros títulos nos quais esteve presente.
Porém, o seu primeiro grande destaque chegou em 1967 no clássico de Robert Aldrich, “Os Doze Condenados“. Interpretando Vernon L. Pinkley, o longa se passa nas vésperas do Dia D e o major do exército americano John Reisman (Lee Marvin) é designado para treinar doze criminosos que serão enviados para uma missão suicida em troca de perdão por seus crimes.
Sucesso de crítica e público, “Os Doze Condenados” foi a maior bilheteria da MGM no ano de seu lançamento, além de receber 4 indicações ao Oscar, sendo vencedor na categoria de “Melhores Efeitos Sonoros“.
Donald começava a trilhar o seu caminho em direção a Hollywood, mas, junto a isso, o ator também passou a fumar cerca de 4 maços de cigarros por dia e, mesmo que parando com o vício algum tempo depois, essa atitude foi o suficiente para lhe acarretar um sério problema de saúde no futuro.
Década de 70: M*A*S*H e a Ordem do Canadá
Hawkeye Pierce. Esse é o nome do protagonista de “M*A*S*H” (1970) interpretado por Sutherland, que logo se tornou um dos marcos de sua carreira. Dirigido por Robert Altman, a comédia mostra um grupo de cirurgiões militares se utilizando do humor e do deboche para conseguir passar pela Guerra da Coreia e aguentar a pressão diária.
Recebendo 5 indicações ao Oscar de 1971, o longa levou a estatueta de “Melhor Roteiro Adaptado” e ainda foi o responsável pela criação da série homônima de enorme sucesso, exibida entre os anos de 1972 e 1983.
Direcionando o seu foco para o cinema, a década de 70 resultou em diversos trabalhos para o canadense, entre eles: “Mercenários de um Reino em Chamas” e “Os Guerreiros Pilantras“, ambos de 1970; a adaptação do impactante livro de Dalton Trumbo, “Johnny Vai à Guerra” e o suspense “Klute, O Passado Condena” ao lado da atriz Jane Fonda em 1971 e, também, “Inverno de Sangue em Veneza” que lhe rendeu uma indicação ao BAFTA na categoria de “Melhor Ator” em 1973.
Três anos mais tarde, contracenou ao lado de Michael Caine e Robert Duvall em “A Águia Pousou“, além de trabalhar com Federico Fellini em “Casanova de Fellini” e Bernardo Bertolucci em “Novecento“. Dois anos depois, em 1978, marcou presença no suspense “Laços de Sangue” de Claude Chabrol e esteve ao lado de Sean Connery em “O Primeiro Assalto de Trem“.
Antes de 1978 acabar, em 22 de dezembro, Donald Sutherland se tornou Oficial da Ordem do Canadá, a segunda maior honraria por mérito no sistema de ordens, condecorações e medalhas do país.
A consagração de Donald Sutherland
Somando mais de 60 trabalhos àquela altura e com uma média de 3 a 5 filmes por ano, a década de 80 continuou a render ainda mais projetos pro ator canadense, consagrando-o como um grande astro das telonas.
Para começar, Sutherland recebeu uma indicação na categoria de “Melhor Ator” no Globo de Ouro de 1981 pelo seu Calvin Jarrett, personagem de “Gente como a Gente” (1980) de Robert Redford. O título ainda foi vencedor de 4 categorias do Oscar, incluindo “Melhor Filme“.
Elogiado pela crítica, no longa, vemos a dinâmica de uma família ser transformada após um acidente causar o óbito de um dos filhos. O acontecimento gera uma tensão entre o irmão do falecido que se culpa pela sua morte e seus pais, uma mãe áspera e um pai atencioso, que não dão o apoio e consolo adequado ao jovem.
Os anos 1980 ainda renderam para Donald um espião alemão em “O Buraco da Agulha” (1981) e também esteve em “A Volta de Max Dugan” (1983), longa com Matthew Broderick e que marca a estreia do ator, que também é seu filho, Kiefer Sutherland.
Alguns anos mais tarde, o ator trabalhou com Sylvester Stallone em “Condenação Brutal” (1989) onde interpretava um diretor de presídio de segurança máxima e com Marlon Brando e Susan Sarandon em “Assassinato Sob Custódia” (1989) onde se tornou um professor que ignorava o apartheid na África do Sul até que o filho de seu jardineiro é morto pela polícia durante um protesto pacífico, fazendo com que o homem inicie a sua própria investigação sobre os fatos.
1990 chegou com “Cortina de Fogo” (1991) onde atuou junto a Kurt Russell e Robert De Niro, esteve com Hilary Swank em “Buffy, A Caça-Vampiros” (1992), com Stockard Channing, Will Smith e Ian McKellen no drama “Seis Graus de Separação” (1993) e com Michael Douglas e Demi Moore em “Assédio Sexual” (1994).
Em 1995 ganhou um Emmy e um Globo de Ouro pela sua atuação em “Cidadão X” e, para terminar a década, recebeu uma nova indicação ao Globo de Ouro na categoria de “Melhor Ator Coadjuvante” pelo seu papel em “Prova de Fogo” (1998).
A Estrela Materializada
Março de 2000 foi marcado com o ator recebendo uma estrela na Calçada da Fama do Canadá, onze anos antes de receber a sua estrela na Calçada da Fama de Hollywood. Além de ser inspiração para a criação do vilão da Marvel Comics, Donald Pierce, o canadense continuou ganhando mais e mais papéis em longas-metragens.
Dentre eles, em “Cowboys do Espaço” (2000), Donald Sutherland interpretou um astronauta com Tommy Lee Jones e Clint Eastwood. Também esteve ao lado de nomes como Mark Wahlberg, Charlize Theron, Edward Norton e Jason Statham no remake de 2003, “Uma Saída de Mestre“, e no épico “Cold Mountain” fez parte do elenco que era composto por Jude Law, Nicole Kidman, Renée Zellweger, Philip Seymour Hoffman e Natalie Portman.
Dois anos mais tarde esteve na adaptação de Joe Wright do romance de Jane Austen, “Orgulho e Preconceito” (2005), com Keira Knightley, Rosamund Pike, Carey Mulligan e Matthew Macfadyen, além de participar do ótimo, porém pouco conhecido, drama “Reine Sobre Mim” (2007) onde, após anos de filmes de comédia, Adam Sandler mostra o seu potencial dramático interpretando um jovem traumatizado pela perda de sua família no fatídico 11 de setembro. Neste longa, ainda temos participações de Don Cheadle, Jada Pinkett Smith e Liv Tyler.
Avançando alguns anos, em 2012, Sutherland entraria em uma franquia distópica repleta de fãs pelo mundo inteiro. Interpretando o ditador presidente de Panem, Coriolanus Snow, o ator esteve a frente do personagem durante as quatro adaptações da trilogia de Suzanne Collins, “Jogos Vorazes” (2012-2015).
Sucesso de crítica e público, a história acompanha Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) se oferecendo como tributo quando sua irmã mais nova, Primrose (Willow Shields), é convocada para ser uma das participantes da 73º edição dos “Jogos Vorazes”, um evento violento e mortal que escolhe uma dupla de cada um dos 12 distritos que compõem a atual nação para competirem entre si até que reste apenas um sobrevivente. No decorrer dos filmes, Katniss se torna um símbolo da revolução que deseja o fim deste sistema e, consequentemente, a queda do Presidente Snow (Sutherland).
Nunca tendo sido indicado ao Oscar, em 2017, o ator recebeu uma homenagem da Academia que lhe concedeu um Oscar Honorário pelo conjunto de sua obra. Você pode conferir o discurso bem humorado e emocionante de Donald Sutherland na íntegra no vídeo abaixo:
Após isso, Donald ainda protagonizou ao lado de Helen Mirren em “Ella e John” (2017), esteve na série histórica do FX, “Trust” (2018), em “Ad Astra: Rumo às Estrelas” (2019) com Brad Pitt, na minissérie da Max “The Undoing: Já Devias Saber” (2020) com Nicole Kidman e Hugh Grant, no longa da Netflix baseado no livro de Stephen King “If It Bleeds” chamado “O Telefone do Sr. Harrigan” e na aventura espacial de Halle Berry e Patrick Wilson “Moonfall: Ameaça Lunar“, ambos de 2022.
Seu último trabalho pode ser conferido na minissérie da Paramount+, “Homens da Lei: Bass Reeves“. A produção é baseada na vida do primeiro vice-marechal afro-americano dos EUA, Bass Reeves (interpretado por David Oyelowo), e, nela, Sutherland interpreta Isaac C. Parker, conhecido como o “Juiz Enforcador” do Tribunal de Fort Smith.
O Adeus
Como mostrado, Donald Sutherland teve uma extensa carreira, acumulando cerca de 200 projetos durante toda a sua vida dedicada a arte e atuação, seja ela televisiva ou cinematográfica. No decorrer dessa jornada, o canadense se casou três vezes e teve cinco filhos: Rossif, Angus, Roeg, Rachel e, o já citado, Kiefer. Em seu perfil no X, Kiefer fez uma postagem tocante em homenagem ao seu pai:
Na mensagem, o ator diz:
Com o coração pesado, digo-lhes que meu pai, Donald Sutherland, faleceu. Pessoalmente, considero um dos atores mais importantes da história do cinema. Nunca se deixou intimidar por um papel, seja ele bom, ruim ou feio. Ele amava o que fazia e fazia o que amava, e nunca se pode pedir mais do que isso. Uma vida bem vivida
A causa oficial da morte não foi revelada até o momento da postagem deste especial mas, como no noticiado através do portal estadunidense Radar Online, é provável que problemas respiratórios decorrentes de uma Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) tenham ocasionado o óbito.
Donald Sutherland faleceu em Miami e era casado com Francine Racette, com quem dividia a vida desde 1972. Seu legado permanecerá eterno, assim como o amor de seus fãs pela sua maravilhosa e brilhante arte, feita com tanta paixão e dedicação por seis décadas. Sem dúvidas, uma vida bem vivida.
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