Com o fim da turnê comemorativa dos 10 anos de seu disco de estreia, “As Plantas Que Curam”, os goianos do Boogarins já iniciaram a trajetória de lançamento do seu mais novo disco “Bacuri”, que carrega a força da independência que sempre caracterizou o grupo, mas agora com um olhar mais maduro sobre o processo criativo.
Este disco, feito com a colaboração de todos os membros, é quase um reflexo do que a banda buscava desde o início, mas com uma abordagem mais artesanal e introspectiva, resultado de um longo período de reclusão e experimentação durante a pandemia. É nesse cenário que nós, do Conecta Geek, entrevistamos os músicos antes do show de estreia do disco novo. Confira abaixo!
CG: Nos últimos 10 anos vocês se tornaram uma referência entre as bandas independentes e, curiosamente, o último disco de vocês dialoga muito com o primeiro, sobretudo na produção caseira. Vocês poderiam falar mais sobre esse processo?
Benke Ferraz: “Uma coisa que foi muito marcante foi o Ynaiã [Benthroldo] ter tocado com o Lee Ranaldo, do Sonic Youth, um tempo atrás. A gente observa de fora essas bandas que foram grandes nos anos 90, que tiveram grandes investimentos e tudo. Quando conversei com o Lee, ele falou que o grande salto para a banda foi quando eles tiveram o próprio estúdio, começaram a gravar por conta própria”, inicia.
“A gente já começou gravando, sabe? Não é a época em que se gravar ou ter o próprio estúdio exige muito dinheiro. Muito antes de uma questão estética, nosso primeiro disco carrega muito dessa questão do artesanal meio que por ser o que a gente poderia produzir, com o que tínhamos. Tanto é que, partir do Manual [2º disco da banda], nossa produção, mesmo acontecendo no meio das turnês, contava com ótimas estruturas de estúdio, sendo que a maioria era de bandas independentes da gringa, como os caras do Black Pumas. Sinto que o Bacuri é quase uma continuidade do que estávamos buscando fazer com o Boogarins, mesmo antes de o Boogarins existir como banda. A ideia era poder produzir as coisas com mais qualidade, nós mesmos, e ir melhorando isso”, finaliza o guitarrista da banda.
CG: Aproveitando a questão da produção, eu queria saber sobre a sua participação [Ynaiã] no disco. Foi a primeira vez que teve uma voz sua no trabalho. Como surgiu isso? Foi algo natural? Todo mundo ficou empolgado para cantar um pouquinho?
Ynaiã Benthroldo: “Acho que sim. Essa música, que acabou virando a faixa-título e que abra o disco, apareceu no contexto da pandemia. Estávamos cada um em sua casa fazendo experimentos. Eu, por exemplo, consegui ter um estúdio. A pandemia foi ruim, mas trouxe algumas mudanças, uma necessidade de criar um ‘casulo’. A gente não tinha isso antes, pois estávamos sempre na estrada. Quando você cria esse casulo, começa a ter tempo para experimentar suas ideias”, explica o baterista da banda.
“Apresentei a música para os meninos com outra roupagem, mas não gostamos muito da versão ao vivo que fizemos, então eu deixei de lado por um tempo. Quando fomos finalizar o disco, decidi colocar minha voz. Eu achei que seria legal fechar esse ciclo dessa música, uma ideia que comecei com meus amigos e que eles curtiram muito. Eles ficaram bem empolgados com o resultado. Eu, inclusive, estava um pouco reticente no início, mas eles se empolgaram muito mais que eu. Foi desafiador para mim, porque tocar e cantar não é minha prática habitual, então estou me esforçando. E tento fazer isso de maneira que me desafie e me permita amadurecer e colocar para fora as minhas ideias”, finaliza Ynaiã.
CG: Voltando um pouco ao processo de independência do grupo. Sem nenhum selo ou pressão externa, de alguma forma vocês criaram o disco mais melódico e com composições mais diretas. A experiência de reinterpretar músicas da galera do Clube da Esquina ajudou nesse processo?
Dinho Almeida: “Cara, esse é o primeiro disco que, nesse exercício de fazer demos e mandar músicas, todo mundo contribuiu com algo. Eu acho que as letras do disco acabaram ficando em um lugar diferente dos outros discos, não sei se melhores, mas mais amadurecidas, mais pensadas. Com certeza, a influência do Clube da Esquina está presente, porque nos envolvemos com esse som, mas algumas músicas já estavam em processo antes disso“, inicia o vocalista e guitarrista do grupo.
“A influência dos membros do Clube [da Esquina] vem mais do nosso momento atual, de querer criar algo mais claro. Os outros discos estavam mais soltos, mais improvisados, sem tanta preocupação em ‘amarrar’ as coisas. Agora, o foco foi em ter uma ideia mais estruturada e um processo individual mais amadurecido de composição e execução. Acho que o Clube da Esquina nos influenciou, mas também Bacuri representa mais esse novo momento da banda”, explica.
CG: Por fim, queria saber sobre a música “Chrystian & Ralf (Só Deus Sabe)”. Como surgiu esse título? O que ele significa para vocês?
Benke Ferraz: “O título ‘Chrystian & Ralf’ surgiu da nossa vontade de fazer conexões, de homenagear uma dupla que tem uma forte ligação com o rock. Eles sempre foram taxados como os roqueiros do sertanejo e têm uma musicalidade que, se fosse dos Estados Unidos, seria chamada de hard rock. Acho que isso tem a ver com a nossa visão de que música é música, independentemente do gênero ou da cena em que se insere”, inicia.
A gente vem de uma cena independente que muitas vezes nega o mainstream, mas, ao fazer isso, você acaba perdendo a chance de aprender com os outros. Depois da gente ter participado do Programa com o Bial, que também contou com participação da dupla Jorge & Mateus, essa ideia amadureceu mais. O ‘Chrystian & Ralf‘ acabou se tornando mais uma homenagem, especialmente porque o Chrystian faleceu recentemente. Isso deu outro sentido ao título, que acabou saindo do plano da ideia inicial para algo mais sentimental
Raphael Vaz: “Um ponto importante e curioso é que essa música é muito ‘nossa’, num sentido mais de Goiás e de Brasil mesmo, algo que certamente não estaria em outro disco. Bacuri virou a casa perfeita pra uma música que carrega esse valor sentimental, de riff, e, claro, do título”, finaliza o baixista (que toca sintetizador também) da banda.
Dinho Almeida: “É verdade Fefel [apelido de Vaz], acabou não dando certo o disco que viria antes de Bacuri nascer, e ele poderia ter sido com o Brian Eno. Seria engraçado ter que explicar pra ele o que é Chrystian & Ralf e como eles foram importantes pra gente. Mas sobre o Eno, esse é um papo para outra entrevista [risos]”, finaliza o papo, Almeida.
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