Oscar 2025 | Críticas dos indicados a Melhor Curta de Animação

A categoria de Melhor Curta de Animação do Oscar 2025 apresenta uma seleção eclética, que vai do stop-motion à animação digital, refletindo a diversidade e inovação no campo da animação mundial. Como é de praxe, esses curtas são feitos de forma independente e frequentemente têm dificuldade em alcançar grandes audiências comerciais. Uma indicação ao Oscar é, portanto, uma rara oportunidade para esses projetos ganharem a atenção do público em massa.

O Conecta Geek assistiu a cada um dos indicados e preparou uma análise de cada curta, destacando as diferentes origens, estilos e narrativas que compõem a lista deste ano. Com produções de países diversos e abordagens que vão de uma visão sombria e introspectiva a conceitos lúdicos e fofos, a seleção deste ano mostra o talento criativo espalhado por diferentes cantos do mundo!

Beautiful Men

Beautiful Men transforma uma questão comum de autoestima masculina em um épico trágico digno de Shakespeare — só que com mais pênis. Muito mais pênis. A animação stop-motion, técnica que já nos deu obras primorosas como “Coraline” e “A Fuga das Galinhas”, aqui é usada para contar a história de três irmãos que viajam a Istambul em busca de transplantes capilares, como se estivessem em uma missão para salvar o mundo, e não apenas alguns fios de cabelo.

O filme tenta abordar as inseguranças masculinas com uma seriedade que beira o ridículo. A calvície, um problema real, mas longe de ser o fim do mundo, é tratada como uma tragédia grega. Os irmãos são retratados como heróis sofridos, lutando contra um destino cruel que os condenou a ter cabeças reluzentes. A animação, por mais bem-feita que seja, não consegue salvar o roteiro de sua própria grandiosidade desproporcional. É como se o diretor dissesse: “Olhem para esses homens! Eles perderam o cabelo, mas ganharam uma crise existencial!”

A técnica de animação, com sua riqueza de detalhes e texturas, é indiscutivelmente impressionante. Cada quadro é estupendo, mas o conteúdo que ele carrega é, no mínimo, questionável. A narrativa oscila entre o melodramático e o absurdo, com cenas que parecem mais preocupadas em chocar do que em desenvolver os personagens. E sim, há uma quantidade absurda de genitálias masculinas, como se o filme quisesse nos lembrar que, além de carecas, esses homens ainda têm… bem, você sabe.

O problema central de Beautiful Men não é a técnica, mas a forma como ele amplifica um problema comum até torná-lo uma caricatura de si. A calvície, que afeta milhões de homens ao redor do mundo, é transformada em um drama tão exagerado que chega a ser difícil levar a sério. E, no processo, acaba reforçando a ideia de que o homem médio é, acima de tudo, um eterno coitado.

Beautiful Men é como um transplante capilar mal feito: promete muito, mas entrega pouco. Ele nos lembra que, às vezes, menos é mais — e que, talvez, a solução para a calvície não esteja em Istambul, mas em aceitar que, no fim das contas, é só cabelo. Ou a falta dele.

In the Shadow of the Cypress

Se um filme pode contar uma história sem pronunciar uma única palavra, In the Shadow of the Cypress é a prova viva disso. Este curta-metragem animado, que lembra a estética minimalista e hipnótica do lindo jogo “Monument Valley”, mergulha nas profundezas do trauma e do TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) com uma narrativa visual que dispensa diálogos, mas não impacto. A animação, em sua simplicidade aparente, é um espetáculo de texturas e sombras que dão vida a um mundo onde o silêncio fala mais alto que qualquer discurso.

O filme gira em torno de um homem atormentado por seu passado e sua relação conturbada com a filha. A metáfora central é poderosa: o cipreste, árvore que simboliza o homem perfeito no sufismo, aqui se transforma na sombra de um pai que, longe de ser perfeito, carrega consigo o peso de escolhas trágicas. A baleia, que surge como um elemento recorrente, representa o fardo emocional que ele impõe à filha — um fardo que ela carrega com resignação, mas também com uma dor silenciosa.

A técnica de animação é um dos pontos altos. Apesar de ser 2D, o uso de texturas e padrões cria uma sensação de profundidade que envolve o espectador. As cenas que ocorrem dentro da mente dos personagens são particularmente impressionantes, com uma estética que remete a sonhos e pesadelos. No entanto, o filme peca ao se estender demais em alguns momentos, como se a narrativa precisasse de um pouco mais de concisão para manter o ritmo.

O tema do TEPT é abordado com sensibilidade, mas também com uma certa ambiguidade. O pai, que sofre com os fantasmas de seu passado, acaba perpetuando um ciclo de dor ao projetar suas frustrações na filha. A cena em que ele se despedaça literalmente é uma das mais impactantes, mas também levanta questões incômodas. Será que o filme sugere que a cura para o trauma está no sacrifício? Ou que a libertação da filha depende da autodestruição do pai? Essas são perguntas que ficam no ar, e nem todas as respostas são satisfatórias.

In the Shadow of the Cypress é uma experiência visualmente deslumbrante, mas que deixa a desejar em alguns aspectos narrativos. Ele nos lembra que o trauma é uma sombra que pode se estender por gerações, mas também que a cura, embora difícil, não precisa ser trágica. E, assim como o cipreste que nunca aparece na tela, sua mensagem permanece enraizada na mente do espectador, mesmo após o crédito final.

Magic Candies

Magic Candies surge como um delicado lembrete sobre a importância da comunicação. O curta-metragem japonês, que mistura animação stop-motion e alegorias encantadoras, convida o público a refletir sobre a natureza da empatia e a necessidade de dar o primeiro passo na construção de relações. Ao contar a história de Dong-Dong, um garotinho que se comunica com objetos e animais após consumir balas “mágicas”, o filme oferece uma visão doce, porém sutil, sobre como a solidão pode ser rompida — mas também faz questão de nos lembrar que, no final das contas, precisamos ir além da mágica.

A beleza do filme está no seu contraste entre simplicidade e profundidade. O charme da técnica da animação — com movimentos delicados que imitam a textura das marionetes — é inegável, mas é o uso do CGI para ampliar as possibilidades de movimento que faz a obra se destacar. O design dos cenários e personagens, às vezes com características quase “feias”, não só reforça a ideia de que o mundo infantil pode ser imperfeito, mas também proporciona uma sensação de realismo em um universo ainda profundamente onírico.

Cada elemento tem sua função, desde o sofá falante — provavelmente o momento mais memorável do filme — até as cores vibrantes que transmitem uma aura mágica, mas com uma pitada de melancolia. É nesse contraste que o curta se destaca: mesmo sendo encantador, ele nunca perde de vista a fragilidade das relações humanas e o medo do isolamento.

No entanto, embora as balas mágicas ofereçam momentos fofos e hilários, especialmente nas interações com o cachorro e o sofá, o filme não mergulha tão profundamente em seus personagens quanto poderia. A relação do garoto com seu pai e avó, por exemplo, é explorada de maneira um tanto rasa, com a sensação de que a narrativa poderia ter se beneficiado de mais tempo para aprofundar essas conexões familiares. Isso gera uma leve descompasso na construção do ritmo, com momentos que parecem mais esquecíveis do que outros.

O filme também flerta com um tipo de humor leve, que sabe explorar a graça do absurdo. Mas essa leveza esconde uma reflexão mais profunda sobre as questões emocionais do protagonista. Dong-Dong começa sua jornada com dificuldades de comunicação, e através das balas, aprende que ouvir não é o mesmo que se isolar atrás de respostas prontas e mágicas. Talvez essa metáfora, quando aplicada à nossa própria realidade, seja mais evidente do que parece: a magia das conexões genuínas não vem de atalhos fáceis, mas de um processo de vulnerabilidade.

Yuck!

Imagine a cena: um grupo de crianças em um resort de férias, cercadas por tobogãs gigantes e piscinas, mas com uma única preocupação na cabeça — beijos. É nesse universo que Yuck! se passa, um curta-metragem que tenta capturar a ansiedade e o nojo típicos da adolescência quando o assunto é romance. A premissa é fofa, quase nostálgica, mas a execução, embora charmosa, deixa a desejar em alguns aspectos.

A animação, que lembra um pouco os desenhos da Nickelodeon, não é exatamente inovadora, mas cumpre seu papel. O recurso visual dos lábios brilhantes, que indicam quando alguém está interessado em beijar, é criativo e até engraçado, mas também pode ser um tanto perturbador. Afinal, quem gostaria de andar por aí com os lábios iluminados como um sinal de neon? A ideia, no entanto, funciona como uma metáfora visual para o despertar sexual e a curiosidade que vem com a puberdade. É como se o filme dissesse: “Ei, todo mundo sabe quando você está a fim de beijar, mesmo que você finja que não!”

A história é simples demais para justificar seus 13 minutos, e a metáfora dos beijos como representação da descoberta hormonal acaba se perdendo em meio a cenas que mais parecem filler. Há um charme nostálgico em ver crianças encarando o primeiro beijo com uma mistura de nojo e fascínio, mas o filme não explora isso de forma profunda. Fica na superfície, como um mergulho raso na piscina deste resort.

A música, por outro lado, é um ponto alto. Com um toque francês que remete a trilhas sonoras de filmes europeus, ela dá um charme extra ao curta. Já a animação, embora simples, tem momentos de beleza. Aquele tobogã gigante, por exemplo, é tão convidativo que dá vontade de pular na tela e dar um mergulho.

Yuck! é como aquele primeiro beijo adolescente: fofo, desajeitado e um pouco constrangedor. Ele não vai revolucionar o mundo da animação, mas consegue trazer um sorriso para o rosto de quem assiste. E, no fundo, talvez seja só isso que ele queira — nos lembrar que, mesmo com lábios brilhantes e toda a ansiedade do mundo, a vida é melhor quando a gente se permite sentir um pouco de “yuck!” de vez em quando.

Wander to Wonder

Em Wander to Wonder, um curta animado inquietante e perturbador, a linha tênue entre o encantamento infantil e o horror é explorada com maestria. Imagine um mundo onde os personagens de um programa infantil, abandonados e esquecidos, tentam sobreviver nas ruínas de um estúdio de gravação. A premissa é simples, mas a forma como é executada é um verdadeiro exercício de ambiguidade emocional, misturando nostalgia com um desconforto existencial.

Os bonecos de stop-motion, meticulosamente animados, ganham vida de uma maneira que nos faz lembrar dos amados personagens de “Toy Story”, mas com um toque macabro. Se, em Toy Story, os brinquedos ganham vida com amor e aventura, aqui, são os mesmos brinquedos, mas à beira do desespero e da decadência. A animação, detalhista e hiper-realista, constrói uma atmosfera mórbida e sombria, que desafia o que estamos acostumados a ver em curtas de animação.

A estética do curta faz um excelente uso de mídias mistas. As sequências que combinam a animação com o live-action, recriando um programa infantil fictício com a qualidade degradada de VHS, são eficazes em criar uma sensação de distopia.

Esse jogo de contraste entre o visual infantil e o cenário desolado e apocalíptico do estúdio abandonado faz o espectador sentir que algo está profundamente errado. A forma como o curta brinca com o “formato de programa infantil” e subverte a expectativa de alegria e segurança em um espaço familiar é onde ele realmente brilha. Isso lembra um pouco da recente tendência de pegar o que é inocente e reconfigurá-lo de maneira sombria, como se viu em outras produções que “transformam” o material infantil clássico em algo quase irreconhecível.

No entanto, apesar das suas inovações visuais e da atmosfera densa, Wander to Wonder se arrisca a se perder na tentativa de criar um mundo denso e alegórico, sem realmente aprofundar as suas ideias. O curta propõe um conceito promissor – personagens de um programa infantil à deriva, tentando entender seu próprio significado e sobrevivência – mas acaba não explorando o suficiente das emoções que isso poderia gerar.

O final, em particular, peca por ser abrupto, deixando o espectador com uma sensação de vazio, como se fosse um pesadelo sem resolução. No fim das contas, é o tipo de curta que, apesar de ser uma experiência intrigante, fica na memória mais pela estranheza do que pela profundidade de sua mensagem.

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Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor valvulado. Editor-chefe, crítico, roteirista, nortista e traficante cultural.