Review | Hell is Us – Um mistério sem guia

Remy volta clandestinamente para Hyria, seu país natal, em plena guerra civil. Essa é a base de Hell is Us, jogo de ação e aventura da Rogue Factor e publicado pela Nacon, apresentando um universo misterioso com foco narrativo, visuais estranhos, inimigos bizarros, e o contraste entre o real e o sobrenatural. Tudo isso com o uma mecânica nomeada pelo diretor, Jonathan Jacques-Belletête, de silver plattering, onde você é seu próprio guia, sem mapas, indicadores ou setas.

Imagem capturada por Vinícius Mesquita

De volta ao lugar onde nunca deveria pisar

Na infância, Remy foi colocado em um caminhão e expulso de Hyria, sua cidade natal, sua única lembrança: a mãe pedindo para nunca mais voltar. Já adulto, ele resolve ignorar o aviso e atravessa a fronteira de volta para o país, agora destruído por uma guerra civil. Quem eram seus pais? O que há por trás do isolamento de Hyria? Essas perguntas guiam a trama — e a primeira pista é só uma memória: o pai dele era ferreiro em uma cidade próxima chamada Jova.

Se perder faz parte do jogo

Aqui não tem minimapa cheio de ícones coloridos. Você aprende se virando. Logo no começo, na floresta Senedra, um velho escondido no porão dá a primeira missão “à moda Hell is Us”: Jova fica nos pântanos de Akaza, mas você só chega lá com um veículo. Pra encontrá-lo? Siga os sinos de vento espalhados na floresta.

Esse tipo de pista indireta é constante. O jogo usa marcos visuais — ruínas, templos, colinas, até um domo sombrio se mexendo no horizonte — como bússola natural. Quando você percebe, já está navegando de cabeça, lembrando “ah, atrás daquela colina tinha uma vila fantasma” em vez de seguir uma flechinha na tela. 

Tudo isso faz parte da tal mecânica silver splattering. Ao mesmo tempo que ela pode ser gratificante, quando descobrimos as pistas por conta própria, seja explorando ou lendo documentos (aqui tem muitos), para alguns jogadores pode se tornar algo frustrante. Afinal, não ter ideia de para onde ou por onde ir, acabando por prosseguir e achando na “sorte” uma direção que vá levar à progressão pode não ser exatamente divertido.

Imagem capturada por Vinícius Mesquita

Cada ruína guarda uma pista

Hell is Us vive de enigmas, espalhados em várias categorias: investigações principais, mistérios opcionais, missões de ajuda aos habitantes e pesquisas mais avançadas que liberam cofres secreto. Tudo isso é apresentado de maneira natural. Seja simplesmente presenciando algum cenário, ou pegando um item, tudo tem uma história e, caso conclua a missão, uma recompensa.

O legal é como tudo conversa com o folclore do lugar. Uma descrição de item pode ser a chave de um puzzle. Um detalhe durante diálogo pode desbloquear um caminho esquecido ou mesmo levar a resolver algum enigma na sua frente.

É aquele momento de “click mental. Você lê uma carta aleatória e lembra de uma porta trancada que viu cinco horas atrás deixando as regiões disponíveis para retorno, caso queira voltar. Isso porque nem sempre a chave para resolver um puzzle, estará diretamente na região que o personagem estará. Poucos jogos fazem isso tão bem.

Um Soulslike… mas só de longe

Muita gente rotula Hell is Us como Soulslike, mas o combate dele é outro papo. Tem estamina, esquiva e defesa cronometrada. Porém, os inimigos não reaparecem quando você morre, sua vida se recupera batendo no momento certo, não com poções (mas elas podem ser uma alternativa). Aqui, o foco está mais em mais controlar grupos de inimigos do que duelar chefões. Enquanto isso, as armas podem ser infundidas com emoções (raiva, medo, luto, êxtase) que também influenciam os inimigos.

Não existem chefes para derrotar, apenas inimigos para descobrir. Alguns são mais fortes, ou chegam em bando, mas o jogo compensa com variedade e a ajuda do seu drone. Batizado como Heidja, ele não só ajuda no combate para atordoar ou nos ajudar diretamente nos golpes, mas também na exploração, servindo de lanterna ou traduzindo textos em uma linguagem desconhecida .

Imagem capturada por Vinícius Mesquita

Quando a mitologia brilha mais que a guerra

Isoladamente, nenhum elemento do jogo é revolucionário. O combate é funcional, os puzzles são inteligentes, a exploração é imersiva. Mas quando as peças se juntam, o resultado é especial. Tudo isso atrelado a um universo e mitologia próprios, onde tudo é um mistério.

Se o game tem um ponto fraco, é a forma como a guerra civil é tratada. O jogo até consegue evitar o espetáculo gratuito e mostra o conflito como algo brutal, mas parece só uma desculpa para não deixar tudo tão esotérico ou mesmo vago. Ainda assim, sente-se a falta de profundidade.

Já a parte sobrenatural e toda a mitologia de Hyria? Essa sim prende até o fim. Cheia de descobertas e lendas esquisitas que dão gosto de explorar e descobrir mais e mais a cada documento, inimigo ou caverna encontrada.

A surpresa que ninguém esperava em 2025

No fim, Hell is Us é um jogo que pede calma, atenção e curiosidade. Ele não te entrega nada de bandeja, mas justamente por isso recompensa a cada detalhe descoberto.

É amplo, ambicioso e, acima de tudo, refrescante. É aquele jogo que vai te prender, e deixar com gostinho de quero mais o tempo todo. E isso, convenhamos, está cada vez mais raro hoje em dia.

Não é perfeito — mas é, sem dúvidas, uma das grandes surpresas de 2025. Um lembrete de que, às vezes, se perder é o que torna a jornada inesquecível.

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