O 8º episódio da 2ª temporada de Ruptura, “Doce Vitríolo”, segue a mesma premissa do anterior, mas com um enfoque diferente. Aqui, acompanhamos um lado pouco explorado da vida de Harmony Cobel, sem a “doçura” do episódio passado, mas com momentos de aflição e uma carga dramática significativa. No entanto, ao contrário do episódio focado em Gemma, este não foi tão bem recebido. Os comentários na internet refletem sua nota baixa em várias plataformas, evidenciando o descontentamento do público. Muitos consideraram desnecessário, um verdadeiro “encher linguiça”, enquanto outros acreditam que tudo poderia ter sido resumido nos últimos 15 minutos. Após assistir e ler as informações disponíveis, aqui está a minha crítica.

A chave para as feridas do passado
Doce Vitríolo começa nos mostrando o destino final da pequena viagem de Harmony Cobel, mostrada lá nos primeiros episódios. Salt’s Neck, uma cidadezinha nada pitoresca, e tão cinza quanto seus habitantes. É perceptível ao longo do episódio que toda a ambientação é para representar o rastro de destruição que a Lumon deixou por lá. Uma cidade praticamente vazia e sem vida, com moradores idosos e debilitados. A primeira parada de Harmony é no restaurante de seu velho colega Hampton (James Le Gros), em busca de ajuda. Ela precisa ir até a casa de sua tia, Celestine ‘Sissy’ Cobel (Jane Alexander), mas teme que lá esteja sendo vigiado pela Lumon, e precisa que ele a leve. Após uma breve relutância, Hampton cede, e então os dois partem na pequena aventura.
Claramente, Cobel não é muito bem recepcionada por sua tia Sissy, que pode ser descrita como uma fiel fervorosa dos ensinamentos e princípios de Kier e da Lumon como um todo. Mas ela não está nem um pouco preocupada com a recepção, ela está em busca de algo e só irá sair dali quando conseguir o que quer. As cenas seguintes são carregadas de melancolia e profundidade. Enquanto Cobel procura por uma chave, as duas discutem sobre os acontecimentos passados, que incluem os estudos da Harmony, seu trabalho e crescimento na Lumon, como a Lumon destruiu a cidade e, por fim, a morte de sua mãe. Sim, foi uma discussão acalorada, mas sem nenhuma visualização do passado, somente os acontecimentos no presente. Como eu disse acima, apesar de seguir a premissa do episódio anterior, Doce Vitríolo não quis ir e voltar no tempo e nos mostrar os acontecimentos. Tudo o que temos são os cenários do depois, imagens de anuários ou lembranças, e a história contada por duas perspectivas diferentes.

Essa escolha parece ser proposital. Até esse momento, não tínhamos plena noção do impacto devastador que a Lumon poderia (e pode) causar. Para muitos, a Lumon era apenas mais uma empresa horrível, excêntrica e maluca, que atuava no setor de biotecnologia e produtos farmacêuticos, explorando seus funcionários para maximizar o lucro — uma descrição bastante comum para várias corporações na vida real. Contudo, Doce Vitríolo deixa claro que o problema vai muito além disso, revelando os traumas profundos deixados pela empresa e como ela está disposta a ir ainda mais longe do que se poderia imaginar. A cidade destruída, os habitantes revoltados — é evidente o desprezo de Hampton pela Lumon — e as memórias traumáticas são aspectos que mostram o verdadeiro alcance da malignidade da empresa.
Harmony encontra a chave do quarto de sua mãe, mas o que acontece a seguir só aprofunda a melancolia. A dor e o sofrimento são mais palpáveis do que as cenas com Gemma no episódio anterior, carregadas de memórias e saudade. É interessante como Ruptura escolheu esses dois episódios para humanizar ou sentimentalizar seus personagens. Em “Chikhai Bardo”, vimos um aprofundamento em Gemma, até então uma personagem secundária, e agora, em Doce Vitríolo, temos Harmony, a vilã imponente da 1ª temporada, que parecia uma figura sólida, composta de raiva e antipatia.
O veneno da verdade
Como sempre, os títulos dos episódios têm um significado importante, e Doce Vitríolo não é exceção. O nome original, Sweet Vitriol, traz significados que se conectam diretamente com a trama. O termo “vitriol” era usado antigamente para descrever um composto altamente corrosivo, geralmente ácido sulfúrico ou seus sais. O nome vem do latim vitriolum, que significa “vidro”, devido à aparência cristalina dessas substâncias. Além disso, no contexto esotérico, o acrônimo V.I.T.R.I.O.L. representa a frase em latim: “Visita Interiora Terrae, Rectificando Invenies Occultum Lapidem”, que se traduz como: “Visita o interior da Terra, retificando-te, encontrarás a pedra oculta”. Filosoficamente, essa frase pode ser interpretada como: “Visita o teu interior, purificando-te, encontrarás o teu eu oculto.”
Esses significados ajudam a compreender o impacto da revelação final do episódio: Harmony Cobel é a criadora do procedimento de Ruptura. Isso mesmo. Os Eagan roubaram a criação de Harmony e apresentaram ao mundo como se fosse deles. Essa informação se conecta diretamente com o título, que pode ser visto como uma metáfora para as revelações bombásticas — ou ácidas — que o episódio nos traz. Além disso, é preciso “visitar” o interior de Cobel para compreender suas motivações e as razões por trás de suas escolhas até o momento.

Doce Vitríolo foi, sem dúvida, o episódio menos eufórico e instigante de Ruptura, mas não menos necessário. Inicialmente, foi difícil apreciar o episódio, e confesso que, assim como outros, pensei que tudo poderia ter sido condensado. No entanto, ao refletir sobre a trama, percebi a profundidade e a necessidade desse episódio, que traz à tona temas como os rastros deixados por uma empresa egocêntrica, a morte prematura sem despedidas, traumas enraizados e ideias roubadas. Ruptura definitivamente não é uma série apenas sobre investigação e mistérios.
Leia as críticas dos episódios anteriores:
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