No episódio final de Pinguim, a minissérie que se desvia das expectativas iniciais de ser apenas um derivado sobre um vilão do Batman, se revela uma obra reflexiva poderosa sobre poder, manipulação e os limites da mudança pessoal. Ao concluir sua trama com um toque de ironia e desilusão, Pinguim entrega mais do que apenas a história de um vilão: ela é uma jornada sobre mulheres lutando contra as estruturas patriarcais e os custos pessoais dessa luta.
A Transformação de Sofia
Ao longo da minissérie, Sofia (interpretada por Cristin Milioti) evolui de uma mulher moralmente dividida, filha do temido chefe da máfia Carmine Falcone, para uma figura de poder imponente, Sofia Gigante. No episódio final, “Algo Grave ou Trivial”, ela se vê como vencedora da guerra de gangues contra Salvatore Maroni (agora morto) e Oz, mas a vitória vem a um preço alto e questionável.
O episódio explora a transformação de Sofia, que, após a morte do pai e sua prisão em Arkham, se liberta de seu passado. Em uma sequência, ela queima a casa de Carmine, simbolizando a tentativa de cortar os laços com o legado de sua família. Porém, o momento de triunfo é ambíguo: embora pareça um ato de liberdade, ele também expõe a pergunta sobre sua real capacidade de romper com o modelo de poder de seu pai, que constrói sua força sobre as costas das mulheres destruídas.
A Manipulação de Oz
A reviravolta final do show não é a ascensão de Sofia, mas o retorno de Oz (Colin Farrell), que recupera o controle ao manipular todos ao seu redor. Quando ele reúne pequenos gangues para combater Sofia, seu motivo subjacente não é a justiça, mas a necessidade de manter o controle absoluto. O episódio deixa claro que, ao contrário de Sofia, Oz não era uma vítima das circunstâncias; ele é uma figura puramente maligna, sem qualquer redenção.
A maneira como a minissérie revela a verdadeira natureza de Oz – um homem que nunca foi uma vítima, mas um manipulador cruel – é uma das escolhas narrativas mais impactantes de Pinguim. Ele estrangula Vic (Rhenzy Feliz), seu suposto aliado, no momento em que o jovem acredita que os dois compartilharam uma conexão genuína. Esse ato final não é apenas uma prova da crueldade de Oz, mas também uma reafirmação da sua indiferença por qualquer forma de empatia ou redenção.
Frances e a trágica Irônica Submissão
Outro aspecto relevante é a história de Frances (Deirdre O’Connell), que, como Sofia, está em busca de poder, mas de uma maneira muito mais submissa e manipuladora. No episódio, vemos como Frances, uma mulher marcada pela busca por status e segurança, acaba se tornando um peão nas mãos de Oz. Sua tentativa de se afastar de seu próprio passado sombrio, ao mudar de ideia sobre matar Oz, resulta em uma punição irônica: ela é deixada em coma e presa na luxuosa cobertura de Oz. O destino de Frances serve como uma crítica ao sistema de poder que ela mesma tentou manipular e ao custo da sua própria humanidade.
Uma história de expectativas destruídas
A trajetória de Vic é uma das maiores decepções da minissérie. Inicialmente posicionado como uma figura que poderia refletir as falhas do sistema ao lado de Oz, Vic rapidamente se torna uma vítima desprovida de agência. Sua morte brutal nas mãos de Oz, um estrangulamento que ocorre no momento em que ele acredita estar se conectando com o vilão, expõe a verdade nua e crua: Vic nunca teve chances de escapar do destino imposto pelas forças maiores. Oz não era um “bom garoto” caindo no sistema; ele sempre foi o opressor.
A Despedida do Pinguim
A conclusão da minissérie deixa um gostinho agridoce. Pinguim poderia ter sido apenas mais uma história de um vilão do Batman, preenchendo os espaços vazios com cenas de violência e desolação. Mas a abordagem de Lauren LeFranc, a showrunner, vai além da caricatura de vilão. A série oferece uma análise sobre a impossibilidade de mulheres como Sofia e Frances de escapar das armadilhas de um mundo controlado por homens e estruturado pelo patriarcado. Elas tentam, mas as circunstâncias e os sistemas de poder são mais fortes.
O episódio também fecha algumas questões não resolvidas ao longo da temporada, como a explosão no final, causada pela ação de Sofia contra a planta da Bliss. Embora seja uma grande cena de ação, a falta de consequências claras sobre a destruição em Gotham parece um descuido narrativo, que deixa uma lacuna no entendimento do impacto dessa violência no universo mais amplo do show e do Batman. Ao não fazer referência direta a esse evento na continuação de Batman, Pinguim deixa uma sensação de que a destruição é apenas mais uma ferramenta de manipulação, mais do que um ponto crucial na trama.
A contribuição de Pinguim ao Universo DC
O verdadeiro mérito de Pinguim, no entanto, está em sua capacidade de questionar as narrativas tradicionais sobre vilões e heroísmo. Ao invés de ser mais uma história de origem ou uma mera expansão do universo de Batman, a minissérie de LeFranc transforma um personagem secundário e sua luta pelo poder em uma meditação sobre o que significa ser humano, sobre os limites da redenção e as complexas dinâmicas de gênero no poder. Pinguim acaba sendo uma história sobre mulheres que tentam – e falham – em escapar das garras de um sistema que nunca foi feito para elas.
Outro fator importante, é que LeFranc nunca esteve interessada em colocar um Batman para ofuscar a história dos seus personagens. Um erro que já aconteceu em outros shows. A Batsinal parece mais um afago para os fãs chatos que procurava alguma conexão com Batman, do que necessariamente uma construção de que o herói virá para uma vindoura 2ª temporada.
A Pinguim poderia facilmente ter se contentado com a ideia de ser uma história rasa e previsível de vilões. No entanto, ao focar na luta interna das suas personagens femininas, Pinguim acaba se tornando uma história relevante e provocativa. No final, a minissérie é sobre quem realmente detém o poder – e, ao empurrar o Pinguim para fora do ninho, ela nos lembra que, muitas vezes, as maiores vitórias vêm à custa de sacrifícios que nem todos estão dispostos a fazer.
Todos os episódios de Pinguim estão disponíveis na Max.
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