Se você é fã de dark romance, aquele subgênero do romance onde os personagens não seguem leis, nem o que é moralmente correto e muito menos estão em busca de redenção, A Duquesa Vingadora é o filme para você. Dirigido por Neil Marshall (“Terror no Deserto”), o longa traz uma história de vingança feminina extremamente ambiciosa, combinando o romance trágico com cenas de ação e violência explícita que vai agradar quem gosta de romance, quem gosta de mulheres fortes e quem gosta de ação com muito tiro e tudo o que um grande filme de vingança à lá “John Wick” serve.
Por mais que a história seja questionável, pelo ponto de vista do dark romance, Scarlett, vivida por Charlotte Kirk, é a perfeita anti-heroína: jovem, inteligente, marginalizada, e seduzida por um homem perigoso e charmoso que a leva para um submundo onde paixão e crime caminham lado a lado. Já Rob, interpretado por Philip Winchester, é aquele arquétipo clássico do criminoso magnético, mais velho, que não espera se apaixonar por uma mulher mais nova, mas que fica completamente encantado por ela, estando disposto a tudo para protegê-la, inclusive não esconder quem ele realmente é.

Pode ser um amor tóxico, mas a relação entre Rob e Scarlett é o que consideramos “fofo”. Todos estão em risco, mas todos são adultos e responsáveis pelos seus atos num relacionamento consensual. Então o julgamento quanto a isso não cabe.
Dito isso, A Duquesa Vingadora não é uma obra que deseja reinventar o gênero, nem ser aclamada como cinema de autor. Ela é uma produção que aposta tudo em um tipo de honestidade narrativa e estética que está, curiosamente, em falta. Enquanto o cinema de ação e o thriller romântico muitas vezes tropeçam ao tentar entregar profundidade forçada ou alegorias vazias, o filme de Marshall vai direto ao ponto: é sobre violência, sensualidade, vingança e um amor sujo, disfuncional, mas intensamente vivido. E nisso, ele funciona.
Charlotte Kirk, que também assina o roteiro ao lado de Marshall, constrói sua protagonista com os clichês certos do gênero: a moça órfã, envolvida com pequenos crimes, que encontra um mundo mais perigoso e sedutor ao cruzar o caminho de um chefão do tráfico de diamantes. O mérito está em não esconder que esses arquétipos são usados propositalmente – o filme nunca tenta “limpar” seus personagens. Pelo contrário, entrega-os como peças trincadas, parte de um submundo onde moralidade é moeda vencida.
Tecnicamente, A Duquesa Vingadora não esconde suas limitações. A fotografia é funcional, com tons frios que dominam a segunda metade do filme – quando a vingança toma conta da narrativa – enquanto a primeira parte aposta em paletas mais quentes e sensuais para marcar a fase do romance. Nada aqui é inventivo ou ousado, mas é coerente. A direção de arte abraça o exagero visual de cenários ostentatórios e roupas de couro, criando um universo estilizado o suficiente para não se levar totalmente a sério.
O som é impactante nos momentos de ação, com trilha que sublinha a intensidade dos tiroteios e perseguições, mesmo que o design de som pareça genérico em cenas mais calmas. As atuações, em sua maioria, seguem o tom caricato da narrativa. Winchester entrega o típico bandido charmoso com expressão fria e voz grave, enquanto Kirk, nos momentos de fúria e dor, adota uma performance que flutua entre o eficaz e o engessado – não há grandes nuances, mas há presença. Isso é o suficiente quando o filme não se propõe a ser drama, e sim um espetáculo de sangue, desejo e perdas.
É verdade que o roteiro tem seus tropeços. A primeira metade do filme, focada quase inteiramente no desenvolvimento do casal, pode frustrar o público que espera adrenalina imediata. Ao optar por esse caminho, o longa estica seu tempo com diálogos pouco inspirados e cenas de “barriga” que poderiam ser resolvidas de maneira mais ágil. No entanto, esse investimento na construção de Scarlett – ainda que raso – serve para dar algum peso emocional à sua transição de vítima a vingadora. Quando a virada acontece, e a protagonista parte em busca de retribuição, o filme entrega o que promete: tiroteios, tortura, sensualidade e violência estilizada.
Outros personagens orbitam Scarlett sem muito destaque. São peças funcionais, como os capangas durões de Rob, que parecem saídos de uma paródia de filme de máfia, ou as amigas de Scarlett, que servem mais como adereços visuais do que como pessoas com história própria. Isso é uma falha de densidade dramática? Sim. Mas é também uma escolha consciente de centralizar tudo na figura da “duquesa”. O filme é sobre ela, e apenas sobre ela.

Nesse sentido, a construção visual da personagem funciona: quando Scarlett entra em seu modo vingança, o figurino muda, a expressão se apaga e a garrafa de vodka se torna símbolo de que nada mais importa além da destruição. Ela não quer justiça. Quer retribuição. E essa distinção é o que transforma o filme num dark romance honesto. Ele não finge que Scarlett tem redenção. Ele a mostra afundando cada vez mais em sua própria dor e raiva.
O que pode parecer pouco – um filme raso, previsível, com atuações medianas e direção correta – é na verdade o que o torna interessante dentro do seu próprio gênero. A Duquesa Vingadora não tenta fazer mais do que aquilo que se propõe, e, hoje, em tempos onde muitas produções do gênero pecam por tentar agradar a todos, isso já é uma virtude. O longa entrega sensualidade, sangue, amor doentio e uma protagonista que queima tudo ao seu redor por aquilo que acredita – ou pelo que sobrou dela para acreditar.
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