A Filha do Palhaço nos apresenta uma história de aceitação entre a relação de um pai e sua filha inspirado na vida comediante Raimundinha

Crítica | A Filha do Palhaço homenageia aqueles que vivem do humor

Você conhece Raimundinha? A personagem, criada por Paulo Diógenes, rendeu muitas risadas no Brasil pós-ditadura e se tornou um ícone no humor cearense. Com uma maquiagem extravagante, roupas bem coloridas e muitas histórias para contar, ela ficou bem conhecida em teatros, palcos e bares. Mas quem era o ator por trás da personagem? Quem era a pessoa de Paulo Diógenes? Inspirado em sua vida, Pedro Diógenes (“Inferninho”), seu primo, nos conta uma história de alegrias, tristezas, medos e aceitação em A Filha do Palhaço, com Demick Lopes (“Fortaleza Hotel”), a estreante Lis Sutter e Jesuíta Barbosa (“Malasartes e o Duelo com a Morte”).

Pelo longa, acompanhamos a Joana, uma jovem de 14 anos, que busca se conectar com o seu pai, Renato, um ator e comediante em Fortaleza Ceará. Renato faz seus shows com a personagem Silvenelly, um alter-ego bem parecido com Raimundinha de Paulo Diógenes. Separados depois de anos, o pai e a filha discutem sobre o passado dos dois, o motivo pelo qual o pai se separou de sua mãe e sobre questões envolvendo sua sexualidade e sua carreira como a Silvenelly.

Logo de cara, dá para saber que não há um relacionamento normal já que Renato apenas aparece em duas ocasiões para ver a filha, sendo o aniversário dela e o Natal. Enquanto conversam, Joana passa a ver o trabalho do pai como uma maneira de se expressar como artista e pessoa, tentando ao longo do caminho fazê-lo entender que não é preciso viver por trás de uma maquiagem para fazer outras pessoas rirem e, mais importante, torná-lo feliz.

Renato se preparando para o espetáculo como Silvenelly (Foto: Divulgação/Embaúba Filmes)

O legado de Raimundinha

Em destaque, podemos ver trechos do show de Silvenelly, inspirado no humor de Raimundinha. No filme, Silvenelly é tratada como uma atração turística de Fortaleza e entretenimento para tanto turísticos e locais, fazendo shows em bares e restaurantes. Com uma mistura de circo com o stand-up, ela faz piadas sobre o cotidiano do Ceará com um sotaque carregado e efeitos sonoros, sempre bem maquiada e usando roupas bem chamativas. Enquanto consegue dar risos para muitas pessoas, podemos ver um outro lado de seu público quando estes zombam e fazem comentários homofóbicos ao artista, chegando até mesmo agressões físicas contra Renato.

A realidade é que através desse trabalho depreciativo é que Renato pode vivenciar um antigo sonho que tinha em ser ator. Mas, para isso, precisa colocar uma máscara, literalmente e figurativamente, para poder se expressar como é e quem queria ser. Assim, através do personagem de Renato e outros personagens, o filme faz uma homenagem ao trabalho de atores e atrizes, mostrando a contradição vivida por várias pessoas que vivem do humor. Acima de tudo, é uma homenagem a Paulo Diógenes, a Raimundinha, e a emoção de vivenciar um pouco de fantasia.

Silvenelly no palco (Foto: Divulgação/Embaúba Filmes)

A produção procurou ser bastante fiel ao estilo do show de Raimundinha, com as perucas, roupas, maquiagens, sons e até gestos da Silvenelly. Ao todo, podemos ter uma recriação bem parecida de seus shows e até mesmo na hora em que o ator tira a maquiagem e fantasia quando o show acaba.

O palhaço e sua filha

Demick Lopes é o foco do longa ao apresentar dois personagens bem distintos: Renato e Silvenelly. Durante a produção, o ator trabalhou de bem perto com as as preparadoras de elenco Samya de Lavor e Elisa Porto para a criação dos dois. Como Renato, uma pessoa confusa de si mesma e deprimida, buscando aceitação da filha e do público como é. Como Silvenelly, alguém animada, engraçada e segura, fazendo piadas e rebatendo qualquer comentário sobre sua pessoa.

Essa dicotomia entre os dois deixa de existir quando Joana entra em cena, misturando as emoções de cada pessoa quando ela está feliz ou sendo ameaçada. Além disso, Renato diz que Silvenelly existe por conta da filha como uma fantasia para agradar ela quando era menor. Renato aprende que não é preciso viver como sua personagem para poder ser feliz e, além disso, que a aceitação de sua filha é a maior coisa que poderia ter ao passar uma semana com ela.

Sobretudo, a estreia de Lis Sutter como Joana é fenomenal ao apresentar uma adolescente que precisa enfrentar seus medos e preconceitos para resolver os fantasmas de seu passado. Experiente com o teatro, a atriz foi escolhida em um casting de toda a cidade de Fortaleza e seu talento encantou a produção de A Filha do Palhaço. No início, Joana está enfurecida e ressentida pelo abandono do pai, querendo saber se é aceita por ele e se pode ser uma prioridade para ela daqui para frente.

Lis Sutter e Demick Lopes trabalharam juntos para criar a relação de pai e filha (Foto: Divulgação/Embaúba Filmes)

Assim, os dois personagens aprendem muito na mistura de experiências, algo que é visto tanto no visual de Joana – de usando roupas mais juvenis para um look mais adulto – quanto a atitude de Renato – de um homem deprimido para alguém mais leve e solto sem ser Silvenelly. O longa consegue explicar seus temas de maneira direta e sem timidez em uma história bem pessoal, calma e alegre, podendo dar ao seu público um sorriso no rosto ao terminar a sessão.

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