Esqueça o Universo Cinematográfico da Marvel (MCU), Planeta dos Macacos é a franquia de grande sucesso mais emocionante da era do CGI. Esses macacos exibem toda a gama de emoções humanas, e é isso que nos faz preocupar com eles: a emoção lenta e de olhos líquidos do chimpanzé César, tocada com tecnologia de captura de movimento expressiva, é a chave para seu brilho. O que poderia ser um fácil caça-níquel, ancorado no sucesso da trilogia encerrada em 2017, Planeta dos Macacos: O Reinado é uma grata surpresa por explorar esse universo por meio de uma distopia política.
Ambientado 300 anos após os eventos de “Planeta dos Macacos: A Guerra”, o último filme começa em uma vila pacífica e verdejante onde o jovem Noa (Owen Teague) e seu clã vivem, pescam e domesticam águias e têm pouca interação com eles. o mundo lá fora. Os pais de Noa alertam-no cautelosamente para ficar longe dos humanos, que são conhecidos como pouco mais do que pragas – coisas estúpidas e silenciosas que roubam comida se puderem evitar. Devido ao vírus produzido pelo homem que acelerou a sua inteligência e quase destruiu a capacidade humana para isso, os macacos ascenderam.
Mas quando a aldeia de Noa é atacada, ele descobre em primeira mão o poder de Proximus (Kevin Durand), um rei gorila fascista que criou para si uma espécie de cidade-estado pré-histórica e procura acesso à antiga tecnologia de guerra humana para conquistar o mundo. Noa é descartado de seu clã após um confronto violento com este grupo de macacos mais avançados e guerreiros, e é jogado em um mundo assustador de desconhecidos na esperança de reunir sua família.
Na jornada de Noa ele conhece Mae (Freya Allen, um dos únicos rostos humanos consistentes no filme), uma misteriosa e desesperada sobrevivente humana que exibe uma inteligência excepcionalmente alta para sua espécie, e Raka (Peter Macon), um velho e sábio orangotango que acredita que os verdadeiros ensinamentos de seu antigo ancião César eram para o homem e o macaco viverem lado a lado.
Através desta luta multiforme pela sobrevivência de cada espécie, o filme levanta questões ponderadas sobre a nossa ordem social – e sobre se nos inclinamos mais naturalmente para a dominação ou para a coexistência pacífica.
Do brilho de desprezo nos olhos do inimigo às manchas de cinza no pelo de um chimpanzé, a textura e o realismo dos efeitos especiais de Planeta dos Macacos: O Reinado são funcionais – se comparado com a excelente trilogia anterior. O diretor Wes Ball (“Maze Runner: Correr ou Morrer”) e sua equipe entendem que o CGI não serve apenas para explosões, mas para tornar os primatas vivos e “respirantes” do filme o mais reais possível para nós. Funciona: quando você acredita em Noa e na situação dele, você entra.
Por falar em Ball, com o longa ele afasta sua escalação duvidosa no comando dessa continuação direta da revitalização da franquia. O cineasta responsável pela série Maze Runner exorciza o que era mais provável, e mostra-se um profissional apto para tarefas maiores, com o resultado apresentado aqui. Envolver o espectador era o mínimo, mas Ball faz isso indo além da elegância; sua eficiência não apenas nas cenas de ação, como na construção dramática em um projeto de material humano quase inexistente é espantosa.
O roteiro, magicamente (para os padrões hollywoodianos) escrito por uma única pessoa, Josh Friedman (“Expresso do Amanhã”), é minucioso na hora de contar o tanto que precisa para se fazer relevante, e como é. O público estará de frente, mais uma vez, a um espetáculo de distopia política clara onde os extremos estão colocados no centro da discussão para mostrar suas verdadeiras faces – por trás de homens e primatas.
A essa altura, uma nova alegoria a respeito de seres mesquinhos que alcançam o poder enganando incautos pelo mundo, instaurando a hegemonia da extrema direita e se vendendo como falsos “messias”, já mostraram sua fala em todo tipo de narrativa. Ela não está gasta em Planeta dos Macacos: O Reinado simplesmente porque esses pilantras golpistas ainda se mostram eficazes em montar seus quadros de desinformações entre asseclas e correligionários, e porque o que é vendido aqui em particular acena para lados ainda mais amplos.
Planeta dos Macacos: O Reinado nos prepara, no campo da metáfora alegórica, para a possibilidade de desligamento moral dentro dos mesmos campos de interesse. No objeto de análise do filme, oprimidos se transformam em opressores assim que têm acesso ao poder, e instauram uma nova ordem de deturpação da visão, as palavras do passado são reformuladas para benefício próprio, mostrando inclusive a criação de uma massa subjugada utilizada como massa de manobra. Qualquer semelhança com ‘mitos’ forjados que vendem discursos populistas vazios não é mera coincidência, roteiro e direção encaminham sua linguagem na direção desse entendimento, inclusive quando remonta que, a qualquer momento, quem um dia foi raça dominante pode voltar a qualquer momento, com a mesma sede de sangue de outrora.
O Reino do Planeta dos Macacos: O Reinado é mais do que um épico de grande orçamento: ele explora dilemas que assombram nosso mundo real – seus personagens discutem sobre os perigos da tecnologia e da proliferação de armas – e tem tanta empatia por seus personagens que você se pergunta se será quer que torçamos pelos macacos, e não pelos humanos. Se este é o primeiro capítulo da história de Noa, mal posso esperar pelo próximo.
2 Comentários