Hellblade e 4 outros jogos que discutem saúde mental

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Hellblade

A saúde mental é um tópico cada vez mais presente nas artes, sendo representada em filmes, como O Babadook, além de livros e nas artes plásticas. Felizmente, os jogos não são nenhuma exceção.

Atualmente, a presença dessa temática em jogos representa um papel muito importante para aqueles que aproveitam uma boa gameplay e história. Isso porque, principalmente durante e após a quarentena, a saúde mental da população ficou muito abalada. Com isso, não é difícil encontrar pessoas que encontraram refúgio nos jogos e tornaram isso um hobby – ou profissão.

Portanto, ter a experiência de jogar algo que promove esse tipo de reflexão é, pelo menos para o seu público, um bom e desejado sinal. Por isso, selecionamos aqui alguns dos jogos que tratam dessa temática das mais variadas formas!

Celeste

Trecho inicial do jogo Celeste, com Madeline conversando com a "velha coroca".
A escalada de Madeline em Celeste não é totalmente solitária.

O aclamadíssimo dos fãs de plataforma e um dos poucos jogos indie a concorrer ao Jogo do Ano no The Game Awards não podia ficar de fora. Celeste não é apenas um daqueles jogos de plataforma que te fazem querer jogar o controle na parede, ele também é uma peça interessante ao analisar o amor próprio.

Madeline, nossa protagonista, é uma jovem mulher trans que tem sérios problemas de auto-estima, sofre com depressão e resolve escalar a montanha Celeste. Na jornada, ela encontra vários colegas escaladores e vários obstáculos, alguns parte da montanha, outros vindos de si mesma.

A “antagonista” do jogo é a chamada Badeline, que nada mais é que um avatar das maiores inseguranças de Madeline, que a persegue, a insulta e zomba de seus esforços.

Na jogabilidade, Badeline literalmente segue e copia os movimentos que os jogadores fazem e, caso o jogador volta atrás em algum movimento, tira uma vida. Essa mecânica serve como uma metáfora incrível – junto com a própria montanha – para quem luta pela sua saúde mental: o esforço em superar um obstáculo intransponível e insistente enquanto você tenta não cair nas armadilhas do passado.

The Last of Us Part II

Ellie, machucada, ensanguentada e preocupada em cena de The Last of Us Part II.
O trauma de Ellie é o grande motivador em The Last of Us Part II

A inclusão de The Last of Us pode parecer estranha, com razão já que o foco do jogo não é exatamente esse. Dito isso, o grande fator que motiva a jornada de Ellie (especialmente no segundo jogo) é seu TSPT, ou transtorno de estresse pós-traumático e sua incapacidade de superá-lo.

O transtorno, como o nome indica, aflige pessoas que passam por experiências traumáticas. Em alguns casos, o trauma pode ser tão grande a ponto de causar sintomas persistentes e intensos, como: pesadelos, flashbacks, medos irracionais, dentre outros.

Os gatilhos acionadores são vistos ao longo de todo The Last of Us Part II: como no momento, até então pacífico, em que Ellie está no celeiro com o bebê JJ e relembra da execução brutal de Joel com o som de uma pá caindo no chão. Esse momento, somado às falas de Ellie sobre como não consegue dormir nem esquecer da perda servem de estopim para o último – e controverso, assim como todo o jogo – ato.

As crises de Ellie provavelmente vêm sido formadas desde o primeiro jogo, com os muitos encontros traumáticos que acontecem; com menção especial ao trecho em que, após Joel ficar incapacitado, ela deve lidar com o líder dos canibais: David.

Será que as próximas temporadas da adaptação continuarão a fazer justiça a Ellie? E será que ainda existem psicólogos no apocalipse?

Life is Strange

Max estendendo a mão para Kate, que está à beira de um prédio , em Life is Strange.
Fatídico momento onde Max tenta confortar Kate em Life is Strange

Life is Strange fez sucesso na época de seu lançamento pela forma criativa em construir a história interativa: a mecânica de rewind, permitindo que o jogador volte no tempo para mudar certas decisões importante. Somando o rewind às revelações que surgem é que levou o jogo a ter o carinho que teve.

Com o retorno da franquia e da protagonista original, Max em Life is Strange: Double Exposure, faz todo sentido revisitar as origens.

O grande foco (e a melhor parte) do jogo são as personagens e a trama. Temas de assédio, cyberbullying, entre outros são explorados, e podemos ver seus efeitos nos adolescentes que protagonizam a narrativa e suas vidas. A história de Kate é um grande exemplo que vem a mente.

De origem religiosa, Kate – após ser drogada pelo maior antagonista do jogo, o professor Jefferson – é humilhada e atormentada nos primeiros capítulos do jogo. Dado certo momento, ela escolhe acabar com sua própria vida em um dos momentos mais tensos da narrativa. O jogador, como Max, pode usar seus poderes para tentar evitar o evento e confortar a colega.

Além de Kate, Chloe (e sua história em Before The Storm) e a própria Max, muitos de nossos personagens passam momentos que são, no mínimo, estressantes. É discutível se Life is Strange realmente leva o debate sobre questões de saúde mental muito a fundo, mas a tentativa é inquestionável e sua inclusão na lista é, portanto, merecida.

Gris

Imagem de Gris, mostrando o rosto da protagonista sendo coberto por uma substância preta.
Gris nos ensina sobre não deixar nossas mágoas nos consumirem

A inclusão que talvez cause estranheza nessa lista por se tratar de uma obra mais sutil, Gris é um daqueles jogos indies conhecidos por levar o meio dos jogos a um patamar artístico impressionante. Mas além de ser um deleite aos olhos, sobre o que é Gris?

A palavra “gris” significa “cinza” em alguns países falantes de espanhol, em francês e até em português (embora bem arcaico). Cinza é uma cor bem peculiar no nosso imaginário, um meio termo entre o preto e o branco, o verdadeiro neutro ou também o tédio e a depressão.

Os hebreus se cobriam de cinza para exprimir uma intensa dor. Entre nós, o gris-cinza é uma cor de luto aliviado. A grisalha de certos tempos brumosos dá uma impressão de tristeza, de melancolia, de enfado.

Jean Chevalier e Alain Gheerbrant em seu Dicionário de Símbolos (tradução por Vera da Costa e Silva, Raul de Sá Barbosa e Angela e Lúcia Melim)

Gris brinca muito com as cores e, além do cinza, cada uma tem uma função e representa algo.

É claro, como uma daquelas obras de artes diferentes interpretações são sempre bem-vindas, mas uma das mais populares é que Gris é sobre o luto e seus estágios, se baseando no modelo proposto pela psiquiatra Elizabeth Kübler-Ross de 5 estágios: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Apesar de ser muito usado, esse modelo é dito como datado e não foi corroborado por muitos estudos da área, mas também não fica sem mérito.

A cada nova cor que o jogador adiciona ao mundo de Gris, uma nova etapa no processo de luto é expressa com várias metáforas espalhadas ao redor. Como se não bastasse, em momentos do jogo, uma massa disforme e preta persegue o jogador, servindo facilmente como uma representação da tristeza, raiva ou qualquer outro sentimento ruim que parece nunca sair do nosso pé em nossos momentos mais vulneráveis.

Senua’s Saga: Hellblade II

Imagem próxima ao rosto de Senua em Senua's Saga: Hellblade II.
Tensão a flor da pele em Senua’s Saga: Hellblade II

A sequência de Hellblade: Senua’s Sacrifice lançada no mês passado, Senua’s Saga: Hellblade II continua a história da guerreira nórdica e sua luta contra criaturas mitológicas e sua própria mente. Confira nossa review de Hellblade II aqui!

A franquia é muito aclamada pela forma inovadora como os jogadores conseguem sentir os surtos psicóticos de Senua, ouvindo vozes que interagem com o jogador durante todo o jogo e moldam o mundo ao redor de Senua. As vozes servem tanto como fonte de encorajamento como de desmoralização.

Para ter certeza que a condição seria retratada de forma realista e não conforme os clichês que vemos em diversas obras, os desenvolvedores da Ninja Theory tiveram constante contato com neurologistas e psicólogos. Tal esforço não foi em vão, como muitas pessoas que já sofreram com a condição afirmam que o jogo a retrata de forma surpreendentemente fiel.

Estudiosos, como a Profª. Dra. Jodie Austin em seu artigo “‘The hardest battles are fought in the mind’: Representations of Mental Illness in Ninja Theory’s Hellblade: Senua’s Sacrifice“, realizaram análises mais aprofundas sobre o tema e o jogo.

Hellblade traz uma das representações virtuais mais sofisticadas de um transtorno mental, por meio da qual os jogadores podem entender melhor e até ter mais empatia com a experiência da psicose.

Jodie Austin (tradução minha)

Fica claro que Hellblade ganhou lugar de importância na discussão da saúde mental e transtornos mentais.

Conclusão e aviso

É importante ressaltar que alguns desses jogos podem dar gatilhos às pessoas mais sensíveis aos tópicos mencionados e, embora recomende que todos experimentem cada um dos jogos, seu bem-estar deve sempre ser a prioridade!

Quais grandes jogos ficaram de fora da lista? Comenta aí, a discussão sempre é bem-vinda!

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