Quarteto Fantástico: As 4 melhores histórias para celebrar a estreia de Primeiros Passos
Marvel Comics

Quarteto Fantástico: As 4 melhores histórias para celebrar a estreia de Primeiros Passos

Desde que passei a colecionar os quadrinhos na adolescência, o Quarteto Fantástico sempre ocupou um lugar especial na minha estante e no meu coração. É profundamente cativante nessa família disfuncional de exploradores cósmicos que consegue oscilar entre discussões domésticas sobre quem deixou a toalha molhada no banheiro e batalhas existenciais contra deuses devoradores de mundos. Eles são, ao mesmo tempo, a equipe de super-heróis mais poderosa da Marvel e um grupo de pessoas falhas tentando fazer seu relacionamento funcionar. Essa dualidade única – o equilíbrio perfeito entre o humano e o fantástico – é o que os torna tão especiais e tão diferentes de qualquer outra equipe nos quadrinhos.

Ao longo de mais de seis décadas, diversos criadores deixaram sua marca no Quarteto, explorando diferentes facetas desses personagens icônicos. Alguns enfatizaram o aspecto aventureiro e científico, outros se aprofundaram nos dramas pessoais, e alguns ousaram desconstruir completamente a mitologia do grupo. Para celebrar a estreia de Quarteto Fantástico: Primeiros Passos, selecionei as quatro histórias que melhor representam essa versatilidade incrível – desde os clássicos atemporais de Lee e Kirby até releituras modernas que desafiam nossa compreensão desses personagens.

Este Homem… Este Monstro! (Stan Lee e Jack Kirby) – 1966

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Não há como falar do Quarteto Fantástico sem começar com uma das histórias mais emblemáticas e emocionantes de toda a mitologia dos quadrinhos: Este Homem… Este Monstro!, escrita por Stan Lee e desenhada por Jack Kirby. Essa história é, para muitos, o ponto culminante da colaboração entre esses dois mestres, uma narrativa que mistura a grandiosidade da ação cósmica com uma profundidade emocional rara, definindo para sempre o que seria uma história de super-heróis verdadeiramente tocante.

A trama começa com Ben Grimm, o Coisa, em um dos momentos mais vulneráveis de sua vida. Abalado pela aparição do Surfista Prateado, que parece ter conquistado o coração de Alicia Masters, Ben se vê em um estado de profunda crise existencial. Vaga pelas ruas de Nova York, questionando seu valor e seu lugar no mundo. Nesse cenário de incerteza e desespero, um cientista amargurado, motivado pela inveja do sucesso de Reed Richards, desenvolve um dispositivo capaz de roubar a aparência de Ben. Esse momento inicial já estabelece o tom sombrio e introspectivo da história, preparando o palco para uma das mais poderosas transformações do personagem.

O que vem a seguir é uma sequência inesquecível, tanto visual quanto emocional. O impostor, agora com a aparência do Coisa, infiltra-se no Quarteto Fantástico com a intenção de assassinar Reed Richards, mas, durante uma missão na Zona Negativa, é confrontado com a coragem e altruísmo de Reed. Isso leva o vilão a questionar seus próprios motivos, culminando em um ato de sacrifício que é, ao mesmo tempo, heroico e profundamente triste. Enquanto isso, Ben Grimm, temporariamente transformado de volta em humano, enfrenta um dilema existencial doloroso. Ao tentar se reconectar com Alicia, Ben descobre que, sem sua aparência monstruosa, ela não o vê mais como um homem digno de amor. Este é um dos momentos mais pungentes da história, um lembrete de que a identidade de Ben, sua verdadeira essência, está entrelaçada com sua forma de Coisa. Quando ele volta à sua aparência rochosa no final, é com um sentimento de aceitação e, paradoxalmente, triunfo: Ben finalmente se reconcilia com quem ele realmente é, em um dos momentos mais tocantes da história do Quarteto.

1234 (Grant Morrison e Jae Lee) – 2001

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Em 2001, Grant Morrison e Jae Lee trouxeram uma visão radicalmente diferente do Quarteto Fantástico em 1234. Esta minissérie de quatro edições, publicada sob o selo (adulto) Marvel Knights, afasta-se completamente do tom aventuresco das histórias clássicas para oferecer um estudo psicológico sombrio e introspectivo dos quatro personagens principais.

Cada edição foca em um membro diferente do Quarteto, explorando suas neuroses e inseguranças mais profundas. Reed Richards é retratado como um gênio atormentado, obcecado com a ideia de que seu intelecto o separa irremediavelmente da humanidade. Sue Storm luta contra a sensação de ser invisível em todos os sentidos – não apenas por seus poderes, mas em seu próprio casamento e na dinâmica da equipe. Johnny Storm questiona se é mais do que apenas um adolescente irresponsável escondido em um corpo adulto. E Ben Grimm… Bem, Ben revive todos os seus demônios sobre ser o Coisa, em uma jornada emocional que é ao mesmo tempo dolorosa e catártica.

Doutor Destino aparece como o vilão principal, mas de uma maneira completamente diferente do que estamos acostumados. Aqui, ele age nas sombras, manipulando os medos e fraquezas do Quarteto de maneiras sutis e psicológicas. Em vez de confrontos espetaculares, temos uma guerra de nervos, com Destino explorando habilmente as fissuras nos relacionamentos da equipe. A cena em que ele confronta Reed, sugerindo que ambos são mais parecidos do que Richards gostaria de admitir, é particularmente perturbadora.

A arte expressionista de Jae Lee, com suas figuras alongadas e sombrias, combinada com a paleta de cores frias de José Villarrubia, cria uma atmosfera opressiva que se afasta completamente do visual tradicional do Quarteto. Os personagens são retratados com uma intensidade quase gótica, seus rostos marcados por sombras profundas que refletem seus conflitos internos. Essa abordagem visual radical pode não agradar a todos os fãs, mas é inegavelmente poderosa e memorável.

Consertar Tudo (Jonathan Hickman, Dale Eaglesham e Neil Edwards) – 2009/2010

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A fase de Jonathan Hickman no Quarteto Fantástico é considerada por muitos como uma das melhores da história do grupo, e Consertar Tudo é o coração dessa narrativa ambiciosa. Hickman constrói uma trama complexa que se desenrola em múltiplos níveis – desde conflitos familiares íntimos até ameaças cósmicas de proporções inimagináveis.

No centro da história está a descoberta de Reed sobre os “Reeds de Todos os Mundos” – uma sociedade secreta de versões alternativas de si mesmo que acreditam ser sua obrigação consertar todos os problemas do multiverso, não importa o custo. Essa premissa permite a Hickman explorar um dos aspectos mais fascinantes de Reed Richards: sua tendência ao absolutismo intelectual, sua crença de que ele sabe o que é melhor para todos. O conflito entre o Reed principal e suas contrapartes alternativas serve como um espelho perturbador, mostrando o caminho que ele poderia seguir se perdesse sua humanidade.

Enquanto isso, os filhos de Reed e Sue – Franklin e Valéria – assumem papéis centrais na narrativa. Valéria, uma criança superinteligente que em muitos aspectos já superou o pai intelectualmente, questiona constantemente as decisões de Reed, servindo como sua consciência moral. Franklin, por sua vez, lida com o peso de ser um mutante capaz de remodelar a realidade, uma responsabilidade assustadora para alguém tão jovem. A dinâmica familiar aqui é mais rica e complexa do que nunca, com Hickman explorando todas as nuances de uma família que é ao mesmo tempo extraordinária e profundamente humana.

O momento mais emocionante da saga vem quando Johnny Storm faz o sacrifício supremo para salvar os outros da “Ninhada” – uma horda de criaturas da Zona Negativa. Sua morte e o funeral subsequente, narrado quase sem diálogos, são de uma emotividade rara nos quadrinhos de super-heróis. A reação de Ben Grimm – que volta a ser o Coisa em um acesso de raiva e dor e parte para uma briga insana com o Hulk – é uma das cenas mais poderosas já escritas sobre o personagem.

Moléculas Instáveis (James Sturm e Guy Davis) – 2003

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Lançada apenas em 2024 no Brasil, mas originalmente publicada em 2003, Moléculas Instáveis é uma das histórias mais inovadoras e comoventes do Quarteto Fantástico. Criada por James Sturm e com arte de Guy Davis, essa minissérie de quatro edições propõe uma reinterpretação radical dos membros do Quarteto, colocando-os em um cenário alternativo: os anos 1950, onde não existem superpoderes, nem aventuras cósmicas. Em vez disso, somos apresentados a versões mais humanas e complexas dos personagens, lutando contra os desafios pessoais da época.

A premissa é simples, mas poderosa. Reed Richards é um professor universitário obcecado por suas pesquisas, negligenciando sua noiva, Sue Storm. Sue, por sua vez, está presa em um papel tradicional de mulher, sendo cuidadora do irmão rebelde, Johnny, enquanto lida com a frustração de se sentir invisível, não apenas por seus poderes, mas também no seu próprio relacionamento. Ben Grimm é um treinador de boxe, um homem fisicamente imponente, mas emocionalmente perdido, incapaz de se conectar com os outros. Cada edição se concentra em um personagem e em suas lutas internas, explorando os dilemas emocionais e existenciais de cada um.

O maior destaque dessa minissérie é como ela humaniza os personagens de uma forma que poucas histórias fizeram antes. Embora não haja elementos fantásticos ou aventuras cósmicas, Moléculas Instáveis captura a essência do Quarteto Fantástico como uma história sobre indivíduos imperfeitos tentando encontrar seu lugar no mundo. É uma reflexão profunda sobre identidade, frustração e a busca por significado em um mundo que parece, muitas vezes, ser muito grande para as pessoas pequenas. A arte de Guy Davis, com seu estilo expressivo e orgânico, complementa perfeitamente o tom melancólico e introspectivo da história.

Essa história foi tão marcante que, no ano passado, eu a incluí entre as melhores do ano passado. Mesmo sem os superpoderes ou as aventuras espaciais, Moléculas Instáveis ressoou profundamente, mostrando que, no fundo, o Quarteto Fantástico é uma história sobre pessoas que, apesar de suas diferenças e falhas, continuam tentando se entender, se amar e se apoiar.

E aí, qual sua história preferida do Quarteto Fantástico? Continue essa lista nos comentários!

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Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor valvulado. Editor-chefe, crítico, roteirista, nortista e traficante cultural.