Em um mundo onde as crianças vivem conectadas a telas e em ritmo acelerado, é fácil se esquecer do valor das coisas simples da vida. Mas é justamente essa simplicidade que Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa traz de volta. O filme não é apenas uma história sobre uma árvore que precisa ser salva; é um lembrete de que os melhores momentos da infância, as melhores memórias e as coisas mais valiosas estão nas coisas pequenas e cotidianas. A vida no campo, com suas brincadeiras no quintal e os amigos de sempre, tem um poder mágico de nos reconectar com o que realmente importa: o afeto, as raízes e a união.
A trama começa de forma leve e divertida: Chico Bento (Isaac Amendoim), o garoto cheio de energia e imaginação, se vê diante de um grande desafio. Ele e seus amigos precisam salvar a goiabeira da ameaça de um projeto de asfaltamento que pode destruir a roça onde vivem. Mas, ao longo do filme, a história se transforma em algo muito maior do que uma simples corrida contra o tempo para proteger uma árvore. É uma reflexão sobre o que está em jogo quando nos deparamos com a ideia de “progresso”. A goiabeira não é só uma árvore; ela representa as memórias, os valores e os laços que formam o coração da vida no campo. E é nesse ponto que o filme se torna muito mais que uma aventura infantil.
A maneira como o diretor Fernando Fraiha escolhe contar essa história é tão encantadora quanto a própria mensagem do filme. Em vez de tentar transformar a narrativa em algo “realista”, como muitos filmes por aí, Fraiha abraça a fantasia com todo o coração. O filme carrega o espírito dos quadrinhos de Maurício de Sousa, com animações e cenas que parecem saltar das páginas e uma narração envolvente. A quebra da quarta parede e a presença de elementos lúdicos fazem com que o filme nos transporte para o universo mágico e acolhedor de Vila Abobrinha. O que vemos na tela é a visão de uma criança, que enxerga a vida de forma pura e cheia de beleza, sem pressa e sem pressões.
A goiabeira de Chico é mais do que um lugar onde ele brinca ou um ponto de encontro com seus amigos; ela é um símbolo de tudo o que é genuíno, de tudo o que vale a pena ser preservado. E isso é algo que o filme nos ensina de forma delicada: enquanto o mundo corre atrás de novidades e inovações, talvez a verdadeira felicidade esteja nas raízes profundas que nos conectam com nossa história e com as pessoas que amamos. Como uma alegoria do valor das coisas pequenas e do que o progresso pode destruir, a goiabeira nos faz refletir sobre o que estamos dispostos a sacrificar em nome de algo que, muitas vezes, não traz verdadeira felicidade.
Não poderia faltar, claro, o elenco que dá vida a esse universo tão afetuoso. O jovem Isaac Amendoim, no papel de Chico Bento, é simplesmente maravilhoso. Sua atuação transborda carisma e sinceridade. Ele consegue ser engraçado e sensível ao mesmo tempo, trazendo uma versão do Chico que é cheia de vida e autenticidade. E quando ele está ao lado de seus amigos, como Rosinha (Anna Julia Dias) e Zé Lelé (Pedro Dantas), a química entre eles é tão genuína que é impossível não se sentir parte da turma. E o Nhô Lau, vivido por Luis Lobianco, traz um humor cheio de sabedoria e trapalhadas, que não só faz rir, mas também aquece o coração.
Essa turma de amigos, unidos pela causa de salvar a goiabeira, é um reflexo do valor do coletivo. O filme nos ensina que, quando nos unimos, podemos enfrentar qualquer desafio, não importa quão grande ele seja. E essa união é um dos maiores poderes da infância. Através das brincadeiras, das confusões e da amizade, Chico e seus amigos mostram que juntos somos mais fortes. Não importa o quanto o mundo tente empurrar a gente para a solidão ou a competição – a verdadeira força está em compartilhar, em se apoiar uns aos outros e em proteger o que é valioso para todos.
Esse tema de coletividade vai além da simples amizade entre as crianças. O filme também oferece uma crítica ao modelo de “progresso” que muitas vezes destrói mais do que constrói. Quando Chico pergunta: “Que mundo é esse que troca goiaba por asfalto?”, ele não está só falando sobre uma árvore; está questionando um sistema que parece acreditar que o concreto e o asfalto são mais importantes do que as coisas naturais e autênticas. É um pequeno grito contra o avanço desenfreado, que muitas vezes não vê a beleza nas coisas simples, mas vê nelas apenas obstáculos a serem superados. O filme, com sua leveza, nos desafia a pensar se o que estamos ganhando realmente vale a pena, ou se estamos perdendo algo muito mais precioso.
Visualmente, Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa também é um show de cores e sensações. O cenário da Vila Abobrinha, com suas casas simples e cheias de vida, nos faz sentir que estamos realmente ali, com a turma do Chico, brincando ao sol. A direção de arte consegue capturar a essência do campo, criando um ambiente que é ao mesmo tempo acolhedor e mágico.
Corroborando com isso, a fotografia de Gustavo Hadba, com suas luzes suaves e quentes, faz com que cada cena pareça um abraço da natureza, lembrando a gente de como a beleza está nos pequenos detalhes: no brilho do sol, no canto dos passarinhos, na sombra da árvore. Cada plano é uma carícia para os olhos, e ao mesmo tempo um convite para desacelerar e observar o mundo com mais atenção.
O roteiro, escrito por Elena Altheman, Raul Chequer e Fraiha, tem aquele equilíbrio perfeito entre humor e emoção. Não se prende a lições pesadas ou complexas, mas nos entrega uma história que fala diretamente ao coração, com os pés bem fincados no chão, mas com o olhar sempre voltado para o céu.
Entre risadas e momentos de reflexão, o filme nos mostra que a vida é feita desses pequenos momentos, dessas grandes aventuras que nascem nas coisas mais simples. E que, mesmo nas situações mais difíceis, o mais importante é nunca perder de vista o que realmente importa: os amigos, a natureza e o amor.
No fina de Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa, com a música “Romaria” tocando ao fundo, a sensação que fica é de uma verdadeira celebração da vida. O filme nos faz pensar sobre o que estamos construindo para o futuro, e nos lembra de que, para que ele seja bom, deve ser coletivo. A alegria, a união e a simplicidade são os ingredientes essenciais para qualquer história de sucesso. Como a goiabeira que dá frutos e se ergue firme, Chico e seus amigos nos ensinam que a vida é feita de momentos simples, mas poderosos. E que, quando estamos juntos, podemos salvar o mundo – um causo de cada vez.
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