Ca7riel & Paco Amoroso me arrastaram para o Lolla contra minha vontade (e me fizeram agradecer por isso)
Foto/Adriana Spaca

CA7RIEL & Paco Amoroso me arrastaram para o Lolla contra minha vontade (e me fizeram agradecer por isso)

Cheguei ao Lollapalooza 2025 no domingo (30) à tarde com aquele misto de ceticismo e esperança típico de quem decide, em um rompante, dar uma chance ao último dia de festival. Não havia enfrentado as agruras dos dias anteriores – as filas intermináveis, os banheiros questionáveis, a exaustão acumulada – e talvez por isso ainda tivesse algum ânimo sobrando. Mas a verdade é que meu interesse se resumia a uma única atração: CA7RIEL & Paco Amoroso, a dupla argentina que havia transformado um Tiny Desk Concert em uma das performances mais contagiantes dos últimos tempos. O resto do line-up? Bem, era o que se espera de um festival desse porte: nomes consagrados, algumas apostas seguras e muita música feita para ser consumida em pedaços de 30 segundos no TikTok.

Quando finalmente me aproximei do palco Mike’s Ice, percebi que não estava sozinho na minha empolgação seletiva. O público que se aglomerava ali não era exatamente uma multidão – nada comparado ao que se via nos palcos principais –, mas tinha uma energia peculiar. Eram, em sua maioria, pessoas que pareciam ter descoberto a dupla através daquela apresentação viral na NPR – como eu –, e agora estavam ali para ver se o caos controlado do estúdio se traduziria em um show ao vivo.

CA7RIEL & Paco Amoroso surgiram no palco sem alarde, como se estivessem entrando em um bar qualquer em Buenos Aires para uma jam session despretensiosa. Não houve discurso de abertura, nem efeitos pirotécnicos, nem aquela pose ensaiada de “artista surpreso com a recepção”. Eles simplesmente começaram a tocar, e em segundos o Mike’s Ice foi tomado por uma onda sonora que misturava rap, trap, jazz e eletrônica de um modo que só eles parecem dominar. “DUMBAI”, a música que abriu o set, já era uma das favoritas do público – graças ao Tiny Desk –, mas ao vivo ela ganhou uma dimensão nova, amplificada pelos metais afiados e pela percussão que parecia pulsar em sincronia com a plateia.

Ca7riel & Paco Amoroso me arrastaram para o Lolla contra minha vontade (e me fizeram agradecer por isso)
Foto/Adriana Spaca

O que mais impressionou, porém, não foi apenas a qualidade técnica – que era inegável –, mas a maneira como a dupla conseguiu equilibrar humor e profundidade, como se estivessem constantemente dizendo: “Isso aqui é sério, mas não vamos levar a sério demais.” Em “#TETAS”, por exemplo, a letra debochada sobre padrões de beleza e cirurgias plásticas foi entregue com uma ironia tão afiada que era impossível não rir – e, ao mesmo tempo, não refletir sobre o absurdo que estavam satirizando. Já em “MI DESEO/BAD BITCH”, a dupla flertou com o trap e o reggaeton, mas subverteu as expectativas com arranjos que lembravam jazz latino, como se estivessem brincando de desmontar gêneros e remontá-los à sua maneira.

Era visível que CA7RIEL & Paco Amoroso não estavam ali para cumprir tabela. Cada música era performada com uma entrega que raramente se vê em festivais, onde muitos artistas parecem estar apenas reproduzindo o que fizeram no estúdio. A banda que os acompanhava – com destaque para os metais e a percussão – acrescentou camadas ricas ao som, transformando as faixas em experiências quase novas. Havia uma química palpável entre todos no palco, como se estivessem se divertindo tanto quanto o público.

Em um momento particularmente memorável, CA7RIEL fez uma pausa para homenagear Liana Padilha, do duo Noporn, que faleceu em 2024. Sem discursos longos, ele simplesmente apontou para a camiseta que vestia – uma referência ao álbum “ADORO DJs” – e deixou que o silêncio e o respeito falassem por si. Foi um contraste poderoso com o resto do show, e uma prova de que, por trás da irreverência, havia uma sensibilidade artística.

Ca7riel & Paco Amoroso me arrastaram para o Lolla contra minha vontade (e me fizeram agradecer por isso)
Foto/Adriana Spaca

Quando o set chegou ao fim com “EL ÚNICO”, o público – que até então tinha sido relativamente contido em tamanho – explodiu em cantoria, como se todos soubessem que aquela era a última chance de extrair energia daquela performance. Saí dali com a certeza de que tinha visto algo especial, algo que raramente se encontra em festivais tão comerciais quanto o Lollapalooza. Enquanto caminhava em direção à saída, assisti um pouco da apresentação legalzinha do Parcels, passei pelo palco onde Foster The People se preparava para tocar e pelo espaço reservado ao Bush – duas atrações que, em outra vida, teriam me feito ficar até o final. Mas naquele dia, nenhuma delas parecia capaz de competir com o que CA7RIEL & Paco Amoroso tinham acabado de entregar.

O Lollapalooza, como todos sabem, é um festival que vive de nomes grandes e de uma estrutura gigantesca. Mas são justamente as atrações “menores”, aquelas que não estão nos holofotes principais, que costumam trazer as surpresas mais gratificantes. CA7RIEL & Paco Amoroso foram, sem dúvida, a minha surpresa do ano. E se há uma coisa que esse domingo me ensinou, é que às vezes vale a pena dar uma chance ao inesperado – mesmo que você só tenha energia para um único dia de festival.

Agora, só me resta esperar que a dupla volte em breve, de preferência em um show próprio, onde eu possa dançar sem medo de esbarrar em alguém que só está ali para o headliner. Porque, no final das contas, é isso que a música deveria ser sempre: uma experiência coletiva, mas também profundamente pessoal. E CA7RIEL & Paco Amoroso entenderam isso como poucos.

As informações e opiniões formadas neste artigo são de responsabilidade única do autor. Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Conecta Geek.

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Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor valvulado. Editor-chefe, crítico, roteirista, nortista e traficante cultural.