Bad Bunny
Bad Bunny volta para suas raízes em Porto Rico no novo álbum. Foto: Eric Rojas / divulgação.

Crítica | Bad Bunny usa a celebração como resistência em ‘Debí Tirar Más Fotos’

Uma das coisas que faz de Bad Bunny um fenômeno único na música pop contemporânea é: ao mesmo tempo em que ele está no auge da carreira, consolidado como o maior nome do reggaeton no mundo, segue na contramão da tendência, sem fazer nenhuma concessão para se moldar ao pop estadunidense. Debí Tirar Más Fotos, seu novo álbum, reforça e expande essa postura.

Após bater recordes com o excelente “Un Verano Sin Ti (2022)” (que funciona como um ensaio do que o artista apresenta agora) e passar pelo trap, versando sobre os excessos e a ostentação da fama em “Nadie Sabe Lo Que Va A Pasar Mañaña” (2023), Benito Martínez faz o caminho de volta para casa e resgata suas origens em um álbum que é divertido, sensível, político e pessoal.

“Debí Tirar Más Fotos” é o movimento de Bad Bunny para resgatar a cultura de Porto Rico, sua terra natal. Aqui, o reggaeton divide espaço com ritmos tradicionais da ilha como a salsa, a plena, a bomba e o jíbaro. Além disso, o disco é recheado de parceiras com artistas locais como RaiNao, Omar Courtz e Dei V, além da colaboração de alunos da Escola de Música Livre Ernesto Ramos Antonini, de San Juan, cidade onde Benito nasceu.

Deveria ter tirado mais fotos

Capa de Debí Tirar Mais Fótos.
Capa de Debí Tirar Mais Fótos, novo álbum de Bad Bunny. Foto: divulgação.

Além dessa mistura ser muito bem azeitada e dar forma a 17 canções deliciosas e cativantes a cada nova audição, ela não apenas serve como um ato de resistência da cultura porto-riquenha, como também funciona como uma celebração da latinidade, com vários pontos de conexão com a américa-latina como um todo.

Um símbolo disso é própria capa do álbum. As duas cadeiras de plástico dispostas em um quintal com bananeiras ao fundo, remetem imediatamente a significados e sentimentos facilmente reconhecíveis por qualquer pessoa de qualquer canto da américa latina, incluindo o Brasil.

Fora a isso, o título do disco trabalha com a ídeia da fotografia como um instrumento de preservação da cultura, como o artista aborda na faixa título, “DTMF”, na qual ele lamenta o fato de não ter tirado muitas fotos de San Juan durante sua juventude e tenta resgatar um pouco das suas memórias afetivas com o lugar.

“Debí Tirar Más Fotos” segue com canções que ora são mais celebratórias, ora são relatos de romances passados e sentimentos a flor da pele como é o caso de “Perfumito Nuevo”, “Turista”, “Ketu Tecré”. Em outras faixas como a surpreendente “Baile Inolvidable”, Benito une essas duas pontas e ao mesmo tempo em que o artista mescla a salsa com o reggaeton ao longo de 6 minutos, também faz confissões de amor.

“El Clúb” e “EOO”, remetem as raízes do reggaeton e caminham para um lado mais dançante, porém com contornos inesperados, como no caso da primeira que desemboca no r&b. “Bokete” faz um divertido trocadilho com as ruas esburacadas de San Juan, e um romance frustrado.

“Lo Que Le Pasó A Hawaii” é uma das faixas que melhor sintetiza o contexto político do disco. Aqui, Benito faz um manifesto contra a invasão dos Estados Unidos na cultura de Porto Rico, e a pressão para que a ilha esteja cada vez mais integrada e dependente ao Tio Sam, afirmando categoricamente que não quer que aconteça com sua terra natal o que aconteceu com o Hawaii.

Bad Bunny tem em “Debí Tirar Más Fotos” o seu álbum mais íntimo e ao mesmo tempo o mais político e ousado. Ao unir a tradição de ritmos porto-riquenhos com o reggaeton e outros elementos do pop atual para contar histórias das suas memórias em San Juan, o astro da forma a seu trabalho mais maduro, com um alto poder de conexão com a cultura latina e resistência frente as opressões externas.

Leia também