Crítica | Demolidor: Renascido – 1×6: Quando os demônios voltam à tona
Marvel Studios/Divulgação

Crítica | Demolidor: Renascido – 1×6: Quando os demônios voltam à tona

Há algo de poeticamente trágico em assistir a um homem tentar fugir de si. Em Demolidor: Renascido, Matt Murdock (Charlie Cox) e Wilson Fisk (Vincent D’Onofrio) são dois lados da mesma moeda — ambos juraram deixar para trás suas naturezas violentas, mas o sexto episódio, “Força Excessiva”, mostra como algumas promessas estão fadadas ao fracasso. E que espetáculo de queda livre é esse!

Acontece que Nova York não está muito interessada em redenções. Enquanto os murais de sangue de Muso continuam aparecendo pela cidade — sim, aquele artista serial killer que usa suas vítimas como tinta —, Matt tenta manter sua promessa de abandonar o manto do Demolidor. Até que Angela (Camila Rodriguez), a sobrinha do Tigre Branco desaparece, e aí… bem, digamos que o fragmento da máscara que ele carregava como lembrança acaba no chão.

Crítica | Demolidor: Renascido – 1×6: Quando os demônios voltam à tona
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É uma cena que vale o episódio inteiro. Cox faz uma atuação tão contida quanto poderosa — você vê nos seus olhos (ou melhor, nos óculos) o exato momento em que ele desiste de lutar contra si mesmo. Quando finalmente veste o traje vermelho novamente, não parece um herói renascido, mas um homem que sabe estar caindo de volta num abismo.

Do outro lado da cidade, Fisk vive seu próprio drama shakespeariano. O ex-Rei do Crime agora é prefeito, mas ninguém parece respeitá-lo — nem os capangas que antes tremiam em sua presença, nem a elite de Nova York que o trata como um animal de circo. D’Onofrio fica alternando entre a fachada civilizada e a fúria assassina com uma facilidade assustadora.

A cena em que ele enfrenta Adam — o amante de Vanessa — é das mais tensas da temporada. Fisk dá ao homem um machado para “tornar justa” a luta, mas todos sabemos que isso é só teatro — o verdadeiro jogo aqui é de humilhação. Quando tudo acaba, com Fisk sentado ao lado do corpo inconsciente de Adam, temos a nítida impressão de que o verdadeiro derrotado é o próprio Rei do Crime.

Falando em derrotas, vamos falar de Muso. Enquanto a maioria dos assassinos em série do cinema tentam esconder seus crimes, esse cara os exibe como obras de arte públicas. Sua introdução é magistral — sem falar uma palavra sequer, apenas através daquela máscara branca e movimentos calculados, ele consegue ser mais assustador que muitos vilões com horas de discurso.

Crítica | Demolidor: Renascido – 1×6: Quando os demônios voltam à tona
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A luta entre ele e Demolidor no metrô abandonado é visceral, suja, cheia de erros de ambos os lados. Não é a coreografia perfeita dos filmes da Marvel — e é exatamente isso que a torna tão boa. Você sente cada soco, cada arranhão. Quando Matt quase mata Muso com a corda de sua bengala, há um momento genuinamente perturbador onde não temos certeza se ele vai parar.

Agora, não vamos fingir que tudo é perfeito. As cenas de Demolidor se balançando entre os prédios continuam sofrendo com um CGI que parece saído de um videogame dos anos 2000. É uma pena, porque o resto da direção é tão boa — as lutas práticas, os closes nos rostos dos atores, a iluminação sombria dos cenários. Por que insistir nesses efeitos visuais duvidosos justo nos momentos que deveriam constuir um clímax?

O episódio também acerta ao mostrar como Fisk está usando sua posição política para voltar ao crime de forma “legal”. Sua força-tarefa anti-vigilantes, composta por policiais corruptos que adorariam ser o Justiceiro, é uma das ideias mais inteligentes da temporada. É o Rei do Crime sendo Rei do Crime — não precisa mais de um taco de beisebol quando pode usar todo o aparato do Estado.

No final, quando Angela acorda e vê o Demolidor diante dela, sua pergunta “Demolidor ?” ecoa como um reconhecimento. A resposta de Matt – “Está tudo bem, estou aqui. Sim, estou aqui.” — soa menos como um conforto e mais como uma admissão. Ele está de volta, mas a que custo?

Força Excessiva pode não ser o episódio mais polido tecnicamente, mas é certamente o mais interessante tematicamente e o que mais avançou na trama até aqui. Ele nos lembra que em Hell’s Kitchen, não há renascimentos sem dor, nem redenções sem recaídas. Tanto Matt quanto Fisk tentaram se reinventar, mas como os murais de sangue de Muso, algumas manchas são simplesmente impossíveis de lavar.

E assim terminamos com Muso fugindo, Demolidor de volta às ruas e Fisk abraçando sua escuridão com uma força-tática anti-mascarados. O título da série nunca fez tanto sentido — nascer de novo parece mesmo exigir morrer um pouco antes. Resta saber quem sobreviverá ao renascimento.

Os episódios novos da 1ª temporada de Demolidor: Renascido são lançados todas as terças-feiras, exclusivamente no Disney+.

Leia sobre os episódios anteriores:

Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor valvulado. Editor-chefe, crítico, roteirista, nortista e traficante cultural.