O último episódio da primeira temporada de Demolidor: Renascido chega como um furacão de emoções, ação e reviravoltas, mas também deixa no ar uma pergunta incômoda: até que ponto essa série sabe exatamente o que quer ser? O nono capítulo funciona como um final explosivo, mas também como um prólogo para uma guerra maior, quase como se fosse um penúltimo ato de um filme. Há o que ser celebrado — o retorno de Karen Page (Deborah Ann Woll) e Frank Castle (Jon Bernthal), a escalada de poder do Rei do Crime (Vincent D’Onofrio), a promessa de uma resistência organizada — mas também há uma sensação de que a série ainda está buscando seu tom definitivo, oscilando entre o realismo sombrio da era Netflix e o exagero operístico do Universo Cinematográfico Marvel (MCU).
A narrativa começa com um flashback revelador (de algo que já sabíamos): Vanessa Fisk (Ayelet Zurer), sempre a sombra por trás do trono, visita Benjamin Poindexter (o futuro Mercenário) e oferece liberdade em troca de um “favor”.
No presente, Matt Murdock (Charlie Cox) acorda após tomar um tiro para salvar o Rei do Crime — um ato que ainda não foi totalmente explicado, mas que reforça a complexidade moral do personagem. Sua recuperação no hospital é interrompida pela chegada de Buck, um capanga de Fisk, obrigando Matt a fugir. Aqui, a direção usa sombras e planos fechados para criar tensão, uma técnica clássica do gênero noir, mas no decorrer do episódio só deixou tudo muito difícil de assistir.
E então, quando tudo parece perdido, surge Frank Castle — o Justiceiro, de volta em grande estilo. A entrada de Jon Bernthal é tão impactante quanto deveria ser: ele aparece no apartamento de Matt como um fantasma armado, pronto para a guerra. A química entre Cox e Bernthal continua eletrizante, com os dois discutindo métodos enquanto destroem os policiais corruptos da força-tarefa de Fisk. A coreografia da luta é brutal, com closes nos punhos cerrados e nos impactos dos socos, no entanto, esse impacto só não é maior, porque a cena — infelizmente não só essa — é tão escura que mal dá entender toda a coreografia.

Enquanto isso, Karen Page ressurge, dirigindo um carro como uma deusa ex-machina para salvar os dois. Sua reintrodução é emocionante, não apenas por ser uma personagem querida, mas porque ela traz de volta a dinâmica afetiva que faltava em Renascido. As cenas entre ela e Matt têm um peso sentimental que contrasta com a frieza de Heather, sua atual namorada, que parece cada vez mais alinhada com os interesses de Fisk.
A Ascensão do Rei do Crime
Enquanto Matt e seus aliados se reorganizam, Wilson Fisk consolida seu poder de maneira quase ditatorial. A cena em que ele esmaga o crânio do comissário Gallo (Michael Gaston) com as próprias mãos é chocante, mas também um tanto caricata—algo que seria mais comum nos quadrinhos do que na série original da Netflix. Esse é um dos dilemas de Renascido: ela tenta equilibrar o tom grounded da antiga produção com elementos mais grandiosos, como Fisk decretando lei marcial em Nova York.

Funciona? Em partes. Se, por um lado, essa abordagem amplia o escopo da série, por outro, ela perde um pouco da intimidade que fazia Demolidor ser especial. A Nova York de Fisk agora parece um cenário de “Uma Noite de Crime”, com policiais corruptos agindo como esquadrões da morte. É eficaz como alegoria política, mas também levanta questões sobre como isso se encaixa no MCU. Se o Rei do Crime controla a cidade dessa forma, onde estão os Vingadores? Ou o Homem-Aranha?
O Dilema do MCU e a Identidade da Série

Esse é um problema que Renascido ainda não resolveu. A série quer ser uma continuação da versão da Netflix, mas também precisa existir no universo compartilhado da Marvel. O resultado é uma narrativa que, embora cativante, parece existir em um limbo. As referências ao MCU são mínimas, e isso pode ser tanto uma virtude (preservando o tom adulto) quanto um defeito (criando inconsistências).
Além disso, há uma clara divisão criativa ao longo da temporada. Os primeiros episódios, focados em Matt como advogado, pareciam pertencer a uma série diferente daquela que vemos agora — uma trama de conspiração política e revolução. Essa mudança de direção, embora bem executada nos episódios finais, deixa claro que Renascido ainda está encontrando sua voz.
Resistência e Esperança
O episódio termina com Matt, Karen e outros aliados se reunindo no Josie’s Bar, planejando a resistência. É um final que lembra “Os Defensores”, mas com um tom mais sombrio. A fala de Matt—“Nós somos a cidade sem medo”—é poderosa, mas também soa como um aceno nostálgico aos fãs.
E então, a cena pós-créditos: Frank Castle, escapando de forma brutal, preparando o terreno para seu retorno. É um gancho eficaz, mas também reforça a sensação de que este final não é um fechamento, e sim um novo começo.

Demolidor: Renascido encerra sua primeira temporada como uma série em transição. Ela tem momentos de grandeza—como a dinâmica entre Matt, Karen e Frank—e outros que parecem forçados, como o exagero no poder de Fisk. Seu ritmo acelerado e sua natureza anticlimática fazem com que o episódio funcione mais como uma ponte para a segunda temporada do que como uma conclusão satisfatória.
No fim, a série ainda está buscando seu lugar—entre o realismo da Netflix e o espetáculo do MCU, entre o drama íntimo e a epopeia urbana. Mas se há uma coisa que esse final prova, é que Matt Murdock e seus aliados ainda têm muito fogo para lutar. E, por mais que Renascido ainda não tenha encontrado seu equilíbrio perfeito, ela pelo menos mantém a chama acesa—e isso, por si só, já é uma vitória.
Os episódios novos da 1ª temporada de Demolidor: Renascido são lançados todas as terças-feiras, exclusivamente no Disney+.
Leia sobre os episódios anteriores:
- Primeiras Impressões | Demolidor: Renascido
- Crítica | Demolidor: Renascido – 1×3: Justiça sem máscara, heróis sem paz
- Crítica | Demolidor: Renascido – 1×4: Justiça, sistema e a sombra do Justiceiro
- Crítica | Demolidor: Renascido – 1×5: Um herói sem capa, mas não sem causa
- Crítica | Demolidor: Renascido – 1×6: Quando os demônios voltam à tona
- Crítica | Demolidor: Renascido – 1×7: Arte sangrenta, conclusão rasteira
- Crítica | Demolidor: Renascido – 1×8: O baile das máscaras e a dança do caos
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