Crítica | Poker Face é uma série versátil e cheia de detalhes envolta em mistérios, drama e comédia

O interessante do cinema é que, mesmo dentro de um universo fictício, consegue trazer muito de nossa humanidade, explora perfeitamente nossos defeitos e vícios, captura perfeitamente muitas histórias que, certamente, já passaram por nós em algum momento de nossas vidas. É a sensação que passa ao assistirmos séries como a primeira temporada de Poker Face (2023) que está incluída no catálogo da Prime Vídeo. Difícil não nos identificarmos com Charlie Cale logo no primeiro episódio.

Mas o que se trata a série?

Charlie Cale (Natasha Lyonne) é empregada de um cassino. Ela é capaz de saber quem está mentindo ou não. Claro que esse dom lhe trará problemas sobretudo após alguns eventos que colocam o proprietário do estabelecimento como principal culpado.

Jurada de morte, Charlie precisa fugir da perseguição do implacável Cliff Legrand (Benjamin Bratt). Para isso, ela vai parando em vários lugares dos EUA e encontrando outras situações inesperadas que desafiam sua inteligência, exigem seu dom, seu senso de investigação e luta por justiça.

Então, espere por 10 episódios que nunca caem na mesmice, com personagens diferentes e lugares inusitados como teatros, oficinas, churrascarias e asilos. Pegando carona numa espécie de Road Movie, nossa querida personagem viaja para lugares diferentes garantindo sua sobrevivência e arrumando empregos temporários.   

Um diretor afiado e uma atriz dinâmica

O primeiro aval para a série dar certo: ter Rian Johnson na direção. O diretor tem em seu currículo filmes como Entre Facas e Segredos (2019) e Glass Onion – Um Mistério Knives Out (2022). Logo, ele é um experiente quando o assunto se trata de tramas envoltas em mistérios. E Poker Face está inserido bastante nesse terreno, o do mistério, mas claro que a série ainda entrega outros gêneros como Comédia e Drama, tudo num equilíbrio correto, prazeroso e convidativo.

Outra cartada certeira é a presença de Natasha Lyonne. A atriz vem numa ótima fase e foi capaz de atuações impecáveis nas séries que participou a exemplo de Orange Is The New Black (2013-2019) e Boneca Russa (Russian Doll, 2019). Novamente se sentindo à vontade, Natasha mostra sua desenvoltura teatral, lança suas piadas ou mesmo suas lições de moral e ainda tem tempo para bancar uma detetive esperta e que se preocupa com a verdade dos acontecimentos.

Mas não é só Natasha que se sobressai. Ao trazer surpresas na rotina de Charlie e mostrando os diversos locais e estabelecimentos que ela percorre, os personagens são variados dando chance ao espectador de saber quem é o vilão (ou vilões) e o mocinho de cada episódio (mas é preciso ficar até o fim). Outras atuações de peso ficam a cargo de Chloë Sevigny, Adrien Brody, Nick Nolte, Ron Perlman e Joseph Gordon-Levitt.

Um toque moderno, vívido e diferenciado.

Poker Face é carregado de vivacidade. Muitos cenários com detalhes que podem passar despercebidos, mas não para a decidida Charlie que fará disso uma provável pista para se chegar ao verdadeiro culpado. Apesar de envolver assassinatos, a série foge da violência extrema e banalizada, preferindo abusar da peripécia aguçada de sua personagem. Outra estratégia é optar por uma reviravolta nos minutos finais eliminando no espectador a ideia de uma conclusão óbvia e previamente decidida.

Mesmo com toque bastante moderno, há quem se lembre de séries policiais antigas como a clássica Columbo (antiga produção dos anos 60 que recebeu diversas premiações). Então, vale arriscar que a série tem sim seu lado um pouco mais retrô ao trazer essa referência old-school das tramas policiais.

As influências não param e num dos episódios, um grupo de idosas que assiste TV pergunta a detetive qual o melhor veneno para matar alguém sem deixar pistas (novamente, os filmes policiais antigos). Nem mesmo o filme Okja (2017) escapa ileso. Ele acaba virando dica para um dos personagens que está em conflito entre comer carne e ser vegetariano.

E tem mais

Ainda há tempo para fazer o espectador refletir. Cada história, a cada personagem novo que pode trazer carisma ou mesmo ódio, em cada crime solucionado, Rian Johnson também pretende fazer a série dialogar com temas que envolvem nosso cotidiano (lembram-se do que disse no início?). E tem muito aqui: amizade, família, lealdade, solidão, velhice, relações amorosas, justiça.

Poker Face é uma das grandes surpresas de 2023 e deixa um final propício para uma segunda temporada. É o que esperamos. Ver Charlie diante de outras situações que revelem todo esse sentimento pra nós, de que a vida pode ser uma caixa repleta de surpresas que nos garantem muitas histórias para ouvir e contar.

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