Quanto mais comum uma vertente de entretenimento se torna, mais provável é que você encontre uma diminuição na distinção e um aumento na homogeneização. No campo dos videogames, um dos gêneros mais usados na última década, para o qual essa filosofia geral pode ser aplicada, são os metroidvanias.
O que antes parecia relativamente novo aos olhos de muitos, agora se transforma em exaustão sempre que é abraçado, fazendo com que novas tentativas precisem se destacar de alguma forma. Felizmente, Voidwrought, desenvolvido pela Powersnake, consegue fazer isso.
Voidwrought é um jogo de plataforma 2D com uma atmosfera sombria que, apesar de sua provável inspiração na estética de “Hollow Knight”, ostenta um tom distinto que reforça sua identidade. Ainda assim, seus sistemas de jogabilidade mornos podem não satisfazer as expectativas dos jogadores veteranos do gênero.
Criando um cenário
A primeira coisa que percebi ao entrar no jogo foi sua atmosfera. Não era apenas um mundo de pixels e códigos, mas um universo de sensações, de melancolia palpável. Como se o próprio ar estivesse impregnado com a memória de uma civilização perdida.
No jogo, controlamos o Simulacro, uma entidade enigmática que surge de um casulo com a missão de reunir o Icor, o fluido vital dos deuses. A trama se desenrola em um mundo tenebroso, meticulosamente desenhado à mão, onde terrores cósmicos residem em cada espaço. O Simulacro percorre os subterrâneos arrasados da Primeira Civilização, repletos de relíquias e artefatos perdidos que têm o poder de liberar forças ancestrais.
A história, simples mas carregada de simbolismo, me arrastou para um estado de imersão profunda. Não há diálogos grandiosos, apenas vestígios de saber, registrados nas pedras espalhadas pelas ruínas. Cada uma delas parecia me contar um segredo, como uma carta antiga deixada ao vento. Se você é daqueles que se perde nas páginas de uma boa história, Voidwrought é como um livro aberto, esperando ser lido com atenção.
Mas, confesso, enquanto me aprofundava nesse universo, algo faltava. A conexão emocional com o mundo, embora rica, parecia distante. A história se revelava mais como uma lição de história, cheia de detalhes interessantes, mas ainda assim, um tanto fria.
Porém, havia algo que me mantinha no jogo. Não era só o cenário, nem mesmo o enredo que, apesar de intrigante, estava longe de ser o centro da minha experiência. Era o som. Cada passo que eu dava era acompanhado por uma sinfonia subterrânea que me fazia sentir cada golpe, cada colisão, como se tudo ao meu redor estivesse vivo.
Os ataques e os impactos tinham uma sonoridade única, quase orgânica, como se a própria terra estivesse reagindo aos meus movimentos. Algo naquelas batidas de metal contra pedra me fascinava. Era como se o jogo falasse com você em uma linguagem que não precisasse de palavras.
O combate, porém, foi onde encontrei a verdadeira dualidade de Voidwrought. Em um primeiro momento, o jogo me parecia simples demais. A ação era rápida, os movimentos, diretos, sem grandes complicações. Um golpe aqui, um ataque ali, e o inimigo caía. Não demorou muito para perceber que o foco estava na velocidade, na sensação de progressão.
A cada movimento, uma sensação de conquista, como se eu estivesse desbravando uma terra que se revelava aos poucos. Mas logo percebi que, na simplicidade dos ataques, o jogo escondia algo mais: a paciência. Era necessário saber a hora certa de atacar, de se esquivar, de usar o espaço ao seu favor.
Na medida que avançava, novos desafios surgiam. O sistema de equipamentos, com Almas e Relíquias, trazia uma sensação de constante evolução. Era como se, a cada passo, eu pudesse me tornar mais forte, mais apto a enfrentar as ameaças que surgiam.
No entanto, algo me incomodava. A dificuldade, que no início parecia moderada, logo se tornava uma dança de facilidades. Os inimigos, embora presentes, eram básicos, sem grandes surpresas. Eu poderia facilmente “tankar” boa parte deles, sem muito esforço. Os chefes, embora interessantes em suas ideias, não conseguiam manter o ritmo de desafio.
Mas, no fundo, algo dentro de mim sabia que Voidwrought estava me contando mais do que apenas uma história de combate. Ele queria me mostrar o que estava nas entrelinhas, o que não se vê à primeira vista. A verdadeira beleza do jogo estava na forma como ele nos conectava com os sons, com as memórias esquecidas, com o silêncio que existia entre as ruínas. Cada pedra que eu coletava, cada corredor que eu explorava, me levava mais fundo em um mistério que não precisava ser resolvido, apenas vivido.
Não demorou muito para que eu me deparasse com o primeiro obstáculo técnico. Um quebra-cabeça simples, mas traiçoeiro, que me deixou preso em uma situação onde não conseguia mais avançar. Foi como estar perdido em um labirinto sem mapa, tentando entender onde havia errado.
Tive que usar todas as minhas forças para voltar ao início e recomeçar. Essa falha, que parecia um pequeno erro de programação, me fez refletir sobre o próprio jogo. Era como a própria jornada de Voidwrought: cheia de altos e baixos, de momentos de clareza e confusão, mas sempre com um objetivo final à vista.
Embora o jogo tenha seus momentos de frustração, há algo de especial em sua proposta. Ele não exige muito de você, mas ao mesmo tempo, oferece uma experiência rica e envolvente para quem sabe apreciá-la. Voidwrought não é um jogo para todos, mas para aqueles que gostam de descobrir segredos, que se perdem nas atmosferas densas, ele é um convite ao mistério.
Eu, pessoalmente, me vi tocado pela sua simplicidade. Não há grandes reviravoltas, mas há um prazer simples em explorar e descobrir. A cada passo, o jogo me convidava a seguir, como se fosse uma promessa não dita de algo maior, algo que não precisava ser explicado, apenas sentido. E, assim, fui seguindo, jogando com fones de ouvido, imerso completamente naquele mundo de sons e sombras.
O que me tocou, ao final, foi a sensação de que Voidwrought é uma alegoria da própria vida. Às vezes, nos vemos perdidos em um mundo de sombras, tentando entender nosso papel em meio a uma história que não parece ser nossa. Mas, no fundo, a jornada é o que importa. Não o fim, não o desafio, mas o simples ato de continuar, de buscar respostas onde elas parecem não existir.
E assim, entre combates e descobertas, cheguei ao fim da minha primeira jornada por Voidwrought. Não foi uma experiência marcante, nem uma das mais desafiadoras, mas foi uma experiência válida. Talvez, no futuro, eu retorne a essas ruínas, com mais paciência, mais imerso nas suas nuances. Talvez, então, o jogo me revele aquilo que não vi da primeira vez.
Por ora, deixo esse relato, como uma pedra de lore esquecida nas ruínas de um mundo digital, esperando que mais alguém o encontre e siga sua própria jornada, nas sombras e nos sons de Voidwrought.
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